O
desejo em Freud:
Em 1895, Freud escreve o artigo: O projeto para uma psicologia científica.
Segundo Roza (1992), constituiu-se numa tentativa de abordar a psicanálise sob
a ótica da neurologia ou da física: “uma
espécie de economia da força nervosa.” A escrita do projeto,
foi abandonada por Freud, entretanto, alguns pontos foram levados adiante, no
decorrer de sua obra. Somente em 1950, O
projeto para uma psicologia científica foi publicado. Neste período Freud aborda a questão do desejo, como estados de desejo.
Os estados
de desejo (Wunsch) dizem respeito a relação mãe(cuidadora) - recém nascido - desamparo. O bebê humano nasce num desamparo e despreparo, é totalmente dependente de um outro sujeito, geralmente a
mãe, não sendo capaz de executar alguma ação, a fim de saciar suas
necessidades.
Essa mãe (ou cuidador) sacia as
necessidades do bebê, entretanto, existem momentos em que a necessidade advém,
e este outro não está ali presente para satisfazer as necessidades, causando um
aumento da tensão, fazendo com que o bebê alucine uma experiência de satisfação, a tensão do organismo diminui, mantendo
a homeostase no organismo.
São traços mnêmicos que são reativados,
fornecendo a ilusão do objeto real. Essa experiência de satisfação marca o
aparelho psíquico, isto é, registra-se uma trilha, próprio desta experiência no
sujeito, que constitui uma imagem mnêmica do objeto como sendo o objeto de
desejo.
Conforme Roza (1992), o bebê, não
distingue o objeto real do objeto alucinado, desencadeando assim o processo que
visa à posse, como esse objeto não é real, advém à frustração. Diante deste
novo aumento de tensão que veio a partir da frustração, o sistema Y (sistema
psi – constituído de neurônios impermeáveis, dotados de resistência.) cria uma
ação inibidora, a qual tem a responsabilidade de impedir a construção da imagem
mnêmica, evitando a alucinação da experiência de satisfação, para assim não
ocorrer à frustração.
Todo esse funcionamento ocorre no interior do organismo
do bebê, não sofrendo a menor influencia da realidade externa. É um
funcionamento conflitante e de perda. Freud dá o nome desta formação de ego,
que nada tem a ver com o ego da segunda tópica, mas que se trata de uma
tentativa de defesa a suposta frustração.
Segundo Safouan (2006), o desejo se
produz no mesmo lugar onde se origina o desamparo vivido pelo recém-nascido, sendo
uma defesa construída pelo imaginário.
Segundo Quinet (2000) os estados de
desejo são os que apresentam as coordenadas simbólicas de prazer – as cadeias
significantes por onde rola o desejo, determinadas
pelo das ding, a “Coisa”, aquilo que,
jamais será encontrado.
Ainda neste texto, Freud introduz a
questão dos sonhos como um exemplo privilegiado do processo primário: a energia
estaria livre, possibilitando uma descarga mais direta.
Os sonhos já aparecem como realizações
de desejo. As idéias oníricas teriam caráter alucinatório, suas conexões mesmo absurdas
e contraditórias, carecem de descarga motora. A lembrança dos sonhos é fraca e
causam pouco dano em comparação com outros processos primários; nos sonhos a consciência
fornece qualidade tal como na via desperta.
Em 1900, no livro a interpretação dos sonhos, Freud decifrou cada um desses pontos
relacionados aos sonhos.
O desejo é uma idéia (Vorstellung) ou um pensamento, algo
distinto da necessidade. O desejo se dá a partir da representação. Diferente
das pulsões que devem ser satisfeitas, o desejo é uma falta.
Os desejos que se realizam nos sonhos
possuem três supostas origens:
1.
Restos
diurnos não satisfeitos: desejos relacionados à vida cotidiana que não foram
realizados;
2.
Restos
diurnos recalcados: desejos também relacionados à vida cotidiana, que foram
suprimidos não por causas externas;
3.
Desejos
pertencentes ao inconsciente que emergem durante o sono.
Os desejos nos sonhos podem ser: desejo
de dormir, oriundo dos sistemas pré-consciente e consciente e desejo de sonho, oriundos
do sistema inconsciente. Os únicos desejos capazes de produzir um sonho são
aqueles pertencentes ao inconsciente, sendo que sua característica principal é o
seu caráter indestrutível.
No sistema inconsciente, o passado se
conserva integralmente e, por conta da regressão, os desejos mais infantis
funcionam como induzidores permanentes de seus conteúdos.
O movimento de regressão não é próprio
dos sonhos, ocorrendo também no estado de vigília, é um movimento retrogressivo
do aparelho psíquico. São imagens mnêmicas. Uma revivificação alucinatória de
uma experiência original.
“Se o sonho é um fenômeno regressivo e
se a regressão é uma “volta atrás” da excitação, concluímos que, ao retornar da
extremidade motora do aparelho, até a extremidade sensória atingindo o sistema
perceptivo, ela passa do pcs/cs para o ics, onde as relações lógicas
demoninantes no pcs/cs não possuem nenhum valor.”
Segundo Roza (1992) o sonho é o
resultado da atração, exercida pelas marcas mnêmicas das experiências infantis,
que exercem certa pressão, na tentativa de uma expressão atual na consciência,
algo semelhante à questão do trauma.
No interior do aparelho psíquico,
existe um conflito, entre o sistema pré-consciente/consciente, e o inconsciente.
O que é realização de desejo inconsciente para os sistemas
pré-consciente/consciente pode trazer angústia, por seu caráter inaceitável,
por isso os pesadelos e os sonhos de angústia. Segundo Roza(1992), neste momento da teoria
freudiana, o conceito de supereu, não havia sido construído, vinte e três anos
depois, Freud denominaria a instância que exerce o policiamento do desejo de
“supereu”.
No capítulo sete do livro: A interpretação dos sonhos, Freud constrói a primeira tópica, que seria a divisão do aparelho psíquico em três partes: o inconsciente, o pré-consciente e a consciente.
O inconsciente apresenta uma sintaxe
particular. Por isso o dito de Lacan: “O inconsciente estruturado como uma
linguagem.” E só
haverá inconsciente, à medida que houver algo a ser recalcado, subentendendo
que existe algo que é insuportável para os sistemas pré-consciente/consciente
que precisa ser afastado, numa medida de proteção ao aparelho psíquico.
“O sonho como realização de
desejo, diz respeito ao discurso de uma parte do sujeito que ele não tem
acesso. O inconsciente diz respeito ao infantil que foi recalcado e o desejo
que está em jogo é o desejo que sofreu interdições: desejo incestuoso em
relação à mãe e hostil e de morte em relação ao pai.”
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