quinta-feira, 19 de julho de 2012

Do desejo dos pais ao desejo do sujeito


O desejo dos pais começa antes mesmo do nascimento do bebê. Existem expectativas, frustrações, projetos, projeções e inibições a serem realizadas por esta futura criança, tanto concretamente, quanto nos aspectos inconscientes e inacessíveis. Segundo Manonni(1987), a criança, geralmente tem por missão reparar o fracasso dos pais, ou mesmo, de realizar-lhes os sonhos perdidos.

O nascimento traz um bebê da realidade, com suas características que lhe são próprias. Entretanto, diferente daquele bebê que os pais fantasiaram. Segundo Tepermen(1996), o desejo fantasiado da gestação precisa de uma adequação, àquele que nasce. Os pais, a princípio, darão significados a cada característica deste bebê, e geralmente se adaptando a realidade.

O bebê nasce imerso num mal entendido fundamental, à medida que é um ser falado. Entretanto, o bebê tem para com os pais, um lugar único. Essa apropriação por parte dos pais e do bebê se dá naturalmente, a partir dos recursos disponíveis.

Num primeiro momento, o bebê está numa posição de desamparo e dependência absoluta. Esta dependência absoluta, não se trata de passividade, Rodulfo (1990) frisa o movimento do bebê na, escolha dos significantes disponíveis do mito familiar:

“(...)para ir em busca desses significantes indispensáveis, é condição necessária que ali haja Outro: corpo familiar, mito, arquivo; que ofereça significantes, que dê lugar.” [1]   

O processo de assujeitamento, que o bebê se submete, em favor do desejo do Outro, denomina-se alienação. Entretanto, essa submissão não é total, existindo uma brecha para as diferenças individuais. O bebê entra com algo que é seu. Portanto a construção do corpo do bebê, não ocorre somente por parte dos pais, trata-se de um jogo assimétrico, situado a partir de uma dependência absoluta ao Outro.

Na realidade, o bebê se vê a partir da mãe, que é, o Outro, tesouro de significantes. O ser humano, na realidade desconhece quem é, pois ainda neste momento, se encontra na profunda alienação.

Num determinado momento, a partir do estádio do espelho, ocorre uma antecipação do psíquico, ao biológico, fazendo com que o bebê tenha a ilusão de integração.

“O estádio do espelho é um drama cujo alcance interno se precipita da insuficiência para a antecipação e que para o sujeito, tomado no equivoco da identificação espacial”.[2]

O estádio do espelho é um momento de identificação, consistindo na transformação, que se produz no sujeito quando ele assume uma imagem. “Esse é você” irá resultar num “sou eu”. A criança se vê através do olhar do outro, mas para ela se apoderar dessa imagem, é necessário que tenha um lugar no Outro.

A mãe dá ao bebê, sua primeira nomeação. No colo, quando a criança volta à cabeça em direção à sua mãe e olha de volta para o espelho, ela está pedindo que a mãe comprove sua descoberta e diga-lhe: “sim, é você, fulano, meu filho”.

Em relação à constituição da linguagem, o bebê, se assujeita ao desejo do Outro, consequentemente é um ser de linguagem, existindo, à medida que a palavra o moldou de um vazio. 

“A alienação dá origem a uma pura possibilidade de ser”[3]

A alienação representa a instituição da ordem simbólica, a atribuição de um lugar para este sujeito no campo simbólico.[4]

Segundo Fink(1989), o sujeito lacaniano está baseado na nomeação de um vazio. Aquilo que funda o sujeito é o significante, este causado pelo desejo do Outro.

A Linguagem e desejo são tramas do mesmo tecido, a linguagem é permeada pelo desejo, e o desejo é inconcebível sem a linguagem, feito da matéria prima da linguagem.[5] 

Segundo Tepermen(1996) o  olhar da mãe, que conjugado à sua voz, nomeia, e dá um lugar para o bebê na família, na sociedade, no campo do simbólico. Esse Outro irá instituir um lugar a partir do qual, o mundo poderá ser organizado, um mundo onde o imaginário pode incluir o real e ao mesmo tempo formá-lo.

 “O que a criança busca é fazer-se desejo de desejo, poder satisfazer o desejo da mãe, quer dizer to be or not to be, o objeto de desejo da mãe (...). Para agradar a mãe (...) é preciso e basta ser o falo. “[6]  

O que parece uma relação dual, na realidade trata-se de uma tríade entre: mãe-bebê-falo. A criança é o objeto de desejo da mãe. Um jogo de demanda e desejo da dupla: mãe e bebê. A mãe é tudo e toda para o bebê, pois neste momento não há nada fora da mãe.
No entanto, esta relação exclusiva e excludente, tão necessária nos primórdios da vida, em determinado momento, deve ser interrompida, pois a lei da mãe é uma lei não controlada.


[1] Rodulfo, 1990 O brincar e o significante. p 52
[2] DOR ,1989, Introdução a Leitura de Lacan- O inconsciente estruturado como linguagem. p.79
[3] FINK,1998, O sujeito Lacaniano: entre a linguagem e o gozo.p.74
[4] FINK, 1998, O sujeito Lacaniano: entre a linguagem e o gozo.p.75
[5] FINK ,1998,  O sujeito Lacaniano: entre a linguagem e o gozo.p.73
[6] Lacan (1999) Seminário 5. Formações do Inconsciente  p. 192

Nenhum comentário:

Postar um comentário