quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Sobre o narcisismo: Uma introdução (1914) - Parte II


Segundo Freud. o caminho mais interessante para estudar o narcisismo é através da psicose, por conta da própria distorção e exagero em relação ao eu, que esta estrutura apresenta. Neste caso há um reinvestimento da libido no Eu. Diferente da neurose que do investimento no eu há um deslocamento da libido aos objetos do mundo externo. 

Algumas situações de retirada da libido descritas por Freud neste texto, que não necessariamente estão relacionadas a psicose:  a doença orgânica, a hipocondria (psicose) e a vida erótica.


  • No caso de doenças ou de dor há um desinvestimento nos objetos, e retorno da libido ao eu. Entretanto, assim que o sujeito se recupera de sua doença/dor volta a investir  sua libido. 

Sobre as doenças orgânicas Freud diz: "Concentrada está a sua alma’, diz Wilhelm Busch a respeito do poeta que sofre de dor de dentes, no estreito orifício do molar’." Sobre o narcisismo: Uma introdução (1914) 

   

  • O hipocondríaco retira tanto o interesse quanto a libido (de maneira intensa) dos objetos externos e volta esse investimento intenso de libido a algum órgão, consequentemente provoca desprazer e consequentemente aumento de tensão no aparelho psíquico. 

"Torna-se agora evidente uma diferença entre  a hipocondria e a doença orgânica. Na hipocondria as sensações aflitivas baseiam-se em mudanças demonstráveis [orgânicas]; na hipocondria, isso não ocorre." Sobre o narcisismo: Uma introdução (1914)

Ao observar a hipocondria surge a pergunta: como se dá a dor física ou lesão sem que o órgão seja concretamente afetado? O próprio investimento da libido erogeniza qualquer parte de corpo. No caso da hipocondria há uma intensa libidinização em determinado órgão, e isso tem efeitos. 

Outro ponto importante, que diferencia a hipocondria da dor física é que na primeira o intenso investimento libidinal em algum órgão é totalizante, não existindo algo que funcione como uma "barreira".  Imagine uma represa que não tem um escoamento da água. O movimento é intenso, sem limites. No caso da dor física  o fato da doença ser nomeada, passível de tratamento ou não, e ter por vezes ganhos secundários da doença. Já funciona como barreira.

"A diferença entre as afecções parafrênicas e as neuroses de transferência parecem-me estar na circunstância de que, nas primeiras, a libido liberada pela frustração não permanece ligada a objetos na fantasia, mas se retira para o ego. A megalomania corresponderia, por conseguinte, ao domínio psíquico dessa última quantidade de libido, e seria assim a contrapartida da introversão para as fantasias que é encontrada nas neuroses de transferência; uma falha dessa função psíquica dá margem à hipocondria da parafrenia, e isso é homólogo à ansiedade das neuroses de transferência. Sabemos que essa ansiedade pode ser transformada por uma elaboração psíquica ulterior, isto é, por conversão, formação de reação ou construção de proteções (fobias). O processo correspondente nos parafrênicos consiste numa tentativa de restauração, à qual se devem as surpreendentes manifestações da doença." Sobre o narcisismo: Uma introdução (1914)

  • O narcisismo e a vida erótica dos seres humanos

No ser humano, a sexualidade está colocada desde muito cedo. Entenda-se que a sexualidade neste caso, não está relacionada ao ato sexual, mas sim ao pulsional. Nos tornamos seres pulsionais e culturais, justamente por sermos erotizados por um cuidador, geralmente a mãe. 
O que isso significa? O humano é um animal que nasce prematuro e despreparado, necessitando de alguém para suprir suas necessidades básicas. A mãe ou cuidadora satisfaz "além" dessas necessidades fornece também palavras, toques e afetos.
O recém nascido  num primeiro momento encontra satisfação em seu próprio corpo, isto é, nas sensações prazer-desprazer que o próprio corpo proporciona a ele. Essas satisfações estão relacionadas as pulsões do eu(auto preservação).  Este momento do bebê, Freud denominou de auto-erotismo, tempo anterior ao narcisismo.


Freud distingue 2 tipos de objetos  que ao longo da vida: 

Anaclítico ou de ligação: Quando os primeiros objetos sexuais (investimento da libido) de uma criança são as pessoas que se preocupam com sua alimentação, cuidados e proteção: a mãe ou cuidador. 

'Narcisistas'  são aqueles que procuram inequivocamente a si mesmos como um objeto amoroso. 

Essa diferenciação entre escolha do tipo anaclítico ou narcisista não determina e nem divide os indivíduos em dois grupos, pois é circular, podendo o sujeito basear-se  ali ou acolá ao fazer suas escolhas. 

"Dizemos que um ser humano tem originalmente dois objetos sexuais — ele próprio e a mulher que cuida dele — e ao fazê-lo estamos postulando a existência de um narcisismo primário em todos, o qual, em alguns casos, pode manifestar-se de forma dominante em sua escolha objetal." Sobre o narcisismo: Uma introdução (1914)

O masculino e o feminino e as escolhas objetais:

Freud ainda faz diferenciações em relação as escolhas objetais entre os sexos masculino e feminino. Sendo que o  sexo masculino apresenta na maioria das vezes o amor objetal do tipo de ligação. E as mulheres o tipo de escolha de objeto 'narcisista'.

Enquanto o homem busca uma mulher (Ativo) ,  A mulher por sua vez busca ser amada.(Passivo) 

As escolhas objetais estão relacionadas aos nossos primeiros anos de vida e as nossas primeiras relações. São marcas e marcos de uma vida e que se reproduzem ou não, mas  que servem de referências. 

Os pais quando tem seus filhos suas expectativas narcísicas são renovadas, através de seus ideais, e sonhos não realizados.

"Se prestarmos atenção à atitude de pais afetuosos para com os filhos, temos de reconhecer que ela é uma revivescência e reprodução de seu próprio narcisismo, que de há muito abandonaram. O indicador digno de confiança constituído pela supervalorização, que já reconhecemos como um estigma narcisista no caso da escolha objetal, domina, como todos nós sabemos, sua atitude emocional. Assim eles se acham sob a compulsão de atribuir todas as perfeições ao filho — o que uma observação sóbria não permitiria — e de ocultar e esquecer todas as deficiências dele." Sobre o narcisismo: Uma introdução (1914)


Como diz Freud das crianças pequenas: ‘Sua Majestade o Bebê’: um filho representa ao pai a imortalidade do eu que foi  oprimida pela realidade, a segurança.




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