sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Feminilidade - Freud 1933

FEMINILIDADE – (1933)

Em Feminilidade, texto que marcaria a segunda etapa da segunda versão do Édipo, a
diferenciação entre os sexos é aprofundada mediante a constatação de que a menina
teria uma fase “pré-edipiana”, de intenso apego à mãe, cujo encerramento Freud considera deva ser explicado.

Em “A dissolução do complexo de Édipo”, o vínculo da menina à mãe é concebido como algo simples, derivado da constatação da “castração”,ou seja, da ausência de pênis. Essa é a principal diferença entre os textos “A dissolução…” e “Feminilidade”.

 (Lembremos que Freud não interpreta a fantasia de castração; ele a entende
literalmente. 

A psicanálise contemporânea — através de Jacques Lacan — interpretará
a fantasia de castração como metáfora de “separação”, enquanto efeito da aquisição da
linguagem, que situa a criança numa posição bem diferente em relação à anterior. A
aquisição da linguagem leva a criança a aceder à posição de sujeito. Anteriormente à
aquisição de linguagem, a criança ocupava a posição de objeto).

 O fator determinante da construção da identidade sexual é a identificação às
expectativas inconscientes dos adultos afetivamente ligados à criança.

A partir da fase fálica, quando o pênis e o clitoris se tornam as partes do corpo que
mais chamam a atenção da criança, é que se instala a diferença. Desta vez, invertendo a
descrição feita no texto anterior (A dissolução…) Freud considera que o Édipo feminino é mais complicado, pois a menina precisará efetuar duas mudanças: mudar
de objeto (mãe para pai) e de centro corporal de prazer (clitóris para vagina).
Para entender como a menina muda de modelo de objeto de desejo, Freud descreve
primeiramente as decepções da menina com a figura materna:
Uma das fantasias da menina seria a de acreditar ter sido insuficientemente
amamentada, porque a mãe teria guardado seu leite para o bebê seguinte.
Suplementarmente, a menina hostilizaria a mãe porque esta a proíbe de explorar seu
próprio corpo, impede as práticas auto-eróticas. Enfim, a educação, as restrições em
geral, “… toda intervenção desse tipo na liberdade da criança deve provocar como reação
uma inclinação à rebeldia e à agressividade“.

Porém Freud não pode deixar de constatar o óbvio, ou seja, que essas queixas também
podem ser feitas pelo menino, que sofre as mesmas restrições.

O fator específico então – essa é a resposta de Freud – é que a menina atribuiria à mãe a responsabilidade (culpa) por não ter pênis. “…não perdoam por terem sido, desse  modo, colocadas em desvantagem“.

O que resultaria na “inveja do pênis”, sentimento que considera universal nas crianças
de sexo feminino. Em consequência, segundo Freud, três alternativas se colocam
para a menina: “…uma conduz à inibição sexual ou neurose, outra à modificação do
caráter no sentido de um complexo de masculinidade, a terceira, finalmente, à
feminilidade normal“.

Esta última alternativa, como as outras, resultaria da “inveja do pênis” mas,
diferentemente das duas primeiras, se expressa pelo desejo de maternidade. O bebê,
então, indenizaria a mulher pela ausência de pênis. Assim a menina ingressaria no
Édipo, aceitando a “castração”. O mesmo motivo que faria com que o menino
“encerrasse” seu Édipo daria início ao da menina. (Freud ainda entende o Édipo como
a relação da criança com os adultos, e não como o momento em que o desejo é
estruturado).

A criança se insere nesse mundo agora habitado pelos gêneros através dos respectivos
modelos de identificação e de relação de objeto (ser e ter). Modelos aliás nunca
absolutizados (daí a latência homossexual na heterossexualidade e a latência
heterossexual na homossexualidade e, além dessa latência, os conflitos
latentes/manifestos, ditos neuróticos/perversos, que expressam a dificuldade em
aceitar o desejo, ou seja, a falta, em sua expressão sexual, isto é, na expressão da
relação desejante com o outro).
O processo de construção da identidade sexual, uma vez diferenciado do primeiro
momento, implica na revogação da crença fálica e culminará com a aceitação
do não dirigido ao próprio desejo… . Ou seja, a restrição ao desejo de não desejar (ter a
propriedade absoluta do objeto de desejo).

A esse processo Freud chamou de formação do superego, e Lacan de internalização da
lei, metáfora paterna, Nome-do-Pai.

Esse processo teria duas etapas: primeiramente, a aceitação da autoridade apenas
quando presente; depois, a internalização da regra (a aceitação do não auto-dirigido), que prescinde da presença da autoridade.

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