sexta-feira, 8 de abril de 2016

Minha leitura: Resistência e Recalque: Conferências Introdutórias sobre a psicanálise (1916-1917)


PAULA ADRIANA NEVES COUTO
PSICANALISTA
paulaadriana.couto@gmail.com
tel: (11) 9 7656-7297
Consultório: Av. Leôncio de Magalhães, 1138 - Jdim São Paulo

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Conferência XIX – Resistência e Recalque:


As resistências permeiam o processo psicanalítico do início ao final. 

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“Em primeiro lugar, então quando assumimos a tarefa de recuperar um paciente para a saúde aliviá-lo dos sintomas de sua doença, ele nos enfrenta com uma resistência intensa e persistente que se prolonga por toda a duração do tratamento.” Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)


As vezes ficava pensando: como alguém que procurou atendimento resiste ao processo? Já que foi o analisante que procurou atendimento, pagou, e paga monetariamente pelo trabalho e pagou e paga também com o seu sofrimento que o sintoma proporciona.  

“Uma pessoa que vai ao dentista por causa de uma dor de dente insuportável, assim mesmo procurará afastar o dentista quando este se aproxima do dente doendo, com um boticão.” Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)

A única regra ao analisante existente no processo analítico: Associação livre. Falar tudo que vier a mente, sem críticas. Absolutamente tudo que surgir a mente deve ser dito, mesmo que aparentemente não tenha nexo. Entretanto, com o tempo percebemos que a associação livre não é tão livre assim, pois mesmo que livremente, nos repetimos e geralmente falamos da mesma coisa e de determinado jeito o tempo todo. Com cada um falamos de uma maneira particular, Em análise, nossa fala é dirigida ao analista que ocupa posição privilegiada. A resistência é inerente a esse processo. Como analistas precisamos estar atentos a isso.

Por vezes, a resistência se dá quando determinado tema é escondido, mantido reservadamente. No cuidado do que se fala para não incorrer em “erros”  ou “equívocos” no uso da  linguagem. Ou mesmo quando nos preocupamos com a regra: será que falei tudo? É melhor falar isso e depois aquilo. Ao mesmo tempo,  essa maneira como se fala, diz do  falador. Uma maneira de resistir, mas também o  “modo de operação” daquele que fala.

A transferência como resistência:

“As resistências intelectuais não são as piores: sempre é possível superá-las. O paciente também sabe, contudo, como erguer resistências sem sair do esquema de referência da análise, e a superação desta situação está entre os problemas técnicos mais difíceis. Em vez de recordar, repete atitudes e impulsos emocionais do início de sua vida, que podem ser utilizados como resistência contra o médico e o tratamento, através do que se conhece como “transferência”. “Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)

Em relação a transferência Freud diz:

“Se esta ligação atinge determinado nível, desaparece todo o seu interesse pela situação imediata do tratamento e todas as obrigações que assumiram no início; seu ciúme, que nunca está ausente, e sua irritação ante a inevitável rejeição, embora expressos respeitosamente, não podem deixar de ter como efeito um dano na harmonia entre paciente e médico e assim inativam uma das mais poderosas forças motrizes da análise.” Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)

A transferência é o grande motor da análise, mas também pode ser seu maior obstáculo.  A resistência faz parte do trabalho analítico. Como manejá-la é a questão. Qualquer coisa que aconteça na vida do analisante terá a análise como responsável: doença, surpresas agradáveis ou desagradáveis, perda do emprego ou uma nova oportunidade. Todos os acontecimentos podem servir a resistência como obstáculo a continuidade do processo analítico.

Do ponto de vista dinâmico (Conflito psíquico), a  resistência, estaria a serviço do eu e sempre entraria em jogo quando no aparelho psíquico houvesse conflito psíquico  entre pcs/cs e ics. Nos primórdios da psicanálise, Breuer e Freud utilizavam o método da hipnose: Tratamento mais rápido e por vezes satisfatório, onde as resistências não entravam em jogo. Entretanto os resultados não eram duradouros. Já o trabalho psicanalítico é um tratamento mais lento e as resistências entram em jogo. Na hipnose o médico conseguia retirar a resistência deixando o campo livre para trabalhar com a hipnose. No trabalho psicanalítico a resistência faz parte do trabalho. Há conflito psíquico há resistência.

Sobre isso Freud diz: “(...)E então compreendi que não se tornaria possível a compreensão da dinâmica destas doenças enquanto fosse empregada a hipnose. (Nota de rodapé: Freud relata-nos que percebeu pela primeira vez a grande importância da resistência durante a análise de Elisabeth von R. Nessa época, ele estava utilizando a técnica da pressão , sem hipnose. Ver “Estudos sobre a histeria” (1895) Edição Standard. Brasileira Vol II. Pag 203. Imago Editora 1974.) Esse estado era justamente capaz de subtrair a percepção do médico a existência da resistência, tornando uma determinada área livre para o trabalho analítico e representava-a nas fronteiras desta área sob uma tal forma, que se  tornava impenetrável, do mesmo modo como a dúvida age na neurose obsessiva.”Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)

A resistência cresce sempre quando se aproxima de um novo assunto. Aumenta sua intensidade quando se chega ao clímax de intensidade da abordagem do tema, e desaparece quando o assunto é posto de lado.

Segundo Freud sobre a resistência, recalque e a formação dos sintomas: “Agora sabemos em que ponto devemos localizar a ação da força que presumimos. Uma violenta oposição deve ter-se iniciado contra o acesso a consciência do processo mental censurável, e por esse motivo ele permaneceu inconsciente. Por constituir algo inconsciente teve o poder de construir um sintoma. Esta mesma oposição, durante o tratamento psicanalítico, se insurge, mais uma vez, contra nosso esforço de tornar consciente aquilo que é inconsciente. É isto o que percebemos como resistência. Propusemos dar ao processo patogênico, que é demonstrado pela resistência, o nome de recalque.”

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Hipótese de Breuer sobre a formação dos sintomas: algum processo psíquico não conseguiu realizar seu objetivo “normal” que seria tornar-se consciente. E aquilo que não pode advir à consciência tornou-se inconsciente. A partir destes processos interrompidos o sintoma emergiu.

Hipóteses sobre o recalque: Qualquer impulso tem origem no inconsciente, entretanto, alguns impulsos são mantidos impotentes (a energia que tinham foi retirada deles  e permanecem como lembranças (Pcs/Cs) e todos esses elementos disponíveis a consciência.  Em contrapartida, há outros impulsos que objetivam ação e que mantém sua carga de excitação. Só que desses impulsos não permanecem lembranças, e não são percebidos pela consciência.

Esse impulso que objetiva a ação, parte do inconsciente via consciente. Freud exemplifica isso com a imagem fotográfica:

“(...) Como uma imagem fotográfica começa como negativo e só se torna fotográfica após haver-se transformado  em positivo. Nem todo negativo transforma-se, contudo necessariamente em positivo; e não é necessário que todo processo mental inconsciente venha a se tornar consciente. Isto pode ser vantajosamente expresso com dizermos que um processo isoladamente pertence, no início, ao sistema do inconsciente, podendo depois em determinadas circunstâncias, passar ao sistema do consciente.”Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)

Do ponto de vista do aparelho psíquico e dos sistemas Pcs/cs e Ics, o que seria alguém supostamente normal? Normal é aquele que não tem impulsos recalcados e consequentemente não fez sintomas?
Só há sintoma porque houve recalque. Os sintomas são substitutos de algo que foi afastado pelo recalque. Qual impulso está sujeito ao recalque?

“Ao investigar a resistência constatamos que ela emana de forças do eu, de traços de caráter conhecidos e latentes. São estes, pois, os responsáveis pelo recalque ou, pelo menos, têm uma participação nela. Presentemente não sabemos de mais nada.” Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)

Nos dois casos citados nas conferências anteriores Minha leitura: Fixação em Traumas – O inconsciente: S. Freud. Conferência XVIII (1916-1917),após investigação minuciosa por parte de Freud concluiu-se que a neurose e os sintomas apresentados pelas pacientes relacionavam-se a intimidade sexual de ambas. Os sintomas serviriam como um substituto da “satisfação” , de desejos sexuais que os pacientes se privavam.

“Pensem no ato obsessivo de nossa primeira paciente. A mulher estava sem seu marido, a quem ela amava intensamente, mas com quem não podia compartilhar sua vida devido às deficiências e fraquezas dele. Tinha de permanecer-lhe fiel; não podia colocar nenhuma outra pessoa no lugar dele. O sintoma obsessivo deu-lhe o que ela desejava, colocar o marido num pedestal; negou e corrigiu suas fraquezas e, acima de tudo sua impotência. Este sintoma era fundamentalmente uma realização de desejo, tal qual um sonho – e, ademais disso, o que nem sempre acontece com um sonho, uma realização de desejos eróticos. No caso da nossa segunda paciente, os senhores puderam pelo menos depreender que seu ritual procurava impedir o coito dos pais ou evitar que ele desse origem a um novo bebê. Os senhores provavelmente também perceberam que no fundo esse ritual procurava coloca-la no lugar de sua mãe. Mais uma vez, portanto, tratava-se de eliminar algo que interferia na satisfação sexual e na realização dos desejos sexuais da própria paciente. Em breve falarei da complicação que mencionei.”Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)

Freud fornece esses dois exemplos e diz que os sintomas funcionaram como realização de desejos sexuais. Quais desejos? Parece confuso, por vezes parece desejo no sentido inconsciente. E por vezes, desejo no sentido de querer.

As ideias de: resistência, recalque, e sintomas e de tratamento descritos no texto, cabem a Neurose de transferência: Neurose obsessiva histeria de conversão e histeria de angustia. O neurótico adoeceria porque seus desejos sexuais não foram realizados. O sintoma é um substituto na realização dos desejos sexuais.  Esses desejos são os inconscientes, infantis. Que jamais serão realizados. “(...)Essas pessoas(neuróticos) adoecem de uma forma ou de outra, de frustrações, quando a realidade as impede de satisfazer seus desejos sexuais. Os senhores verificam com que perfeição estas duas (resistência e recalque) descobertas se harmonizam entre si. Assim é que os sintomas podem ser adequadamente visualizados como satisfações substitutivas daquilo que se perde na vida.”Resistência e Recalque: S. Freud. Conferência XIX (1916-1917)

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