quarta-feira, 20 de abril de 2016

Outra leitura: Conferência XX – A VIDA SEXUAL DOS SERES HUMANOS - (1916-1917)

CONFERÊNCIAS INTRODUTÓRIAS SOBRE A PSICANÁLISE

Conferência XX – A VIDA SEXUAL DOS SERES HUMANOS

Freud inicia esta conferência abordando a dificuldade em definir a sexualidade humana. Conceito amplo que vai da distinção anatômica entre os sexos às perversões. Interessante que as questões envolvidas à sexualidade são geralmente pautadas por valores morais, com certo tom pejorativo.

Nos animais,  a sexualidade é genital e voltada a reprodução da espécie. Geralmente no humano, o que se busca no sexo é o prazer, sendo que cada um encontra prazer no sexo de maneira particular. Por isso tanta diversidade.

Duas observações extraídas da prática psicanalítica sobre a sexualidade nas neuroses:

1.  “Os sintomas neuróticos são substitutos da satisfação sexual”

Em relação a neurose é importante afirmar que Freud ainda neste momento (1916-1917) acreditava na ideia de normalidade.  Os doentes psíquicos seriam: os neuróticos, psicóticos e perversos.

Os neuróticos teriam desejos sexuais perversos, os quais os realizaria através dos sintomas. Sobre isso Freud diz: “Pois somente será válida se na satisfação sexual incluirmos a satisfação daquilo que se chama necessidades sexuais pervertidas, de vez que, com frequência surpreendente, se nos impõe uma interpretação de sintomas desta espécie. A reivindicação que fazem os homossexuais ou invertidos de serem uma exceção desfaz-se imediatamente ao constatarmos que os impulsos homossexuais são encontrados invariavelmente em cada um dos neuróticos e que numerosos sintomas dão expressão essa inversão latente. Aqueles que se proclamam homossexuais são apenas invertidos conscientes e manifestos e seu número nada é em comparação com os dos homossexuais latentes”  A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)

Existiria no neurótico algo da sexualidade perversa vivida de forma latente e não manifesta.

Freud cita um dos  casos abordado nas conferências anteriores: “Os senhores talvez se recordem de que uma de nossas pacientes, em seu ato obsessivo, comportava-se como homem, como se fora o próprio marido de quem se separara; mulheres neuróticas muito frequentemente produzem sintomas assim, à feição de um homem. Ainda que isso não se deva considerar homossexualismo relaciona-se muito de perto com as precondições desta.” A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)

Interessante como o sintoma além de ser revivido é falado. Onde está a satisfação substitutaO prazer substituto do sintoma está na revivência da cena ou no conta-la  a terceiros ou em ambas?

A neurose histérica pode produzir seus sintomas em qualquer sistema de órgãos e perturbando suas funções. Os impulsos pervertidos substituem o órgão genital por qualquer outro órgão e estes órgãos comportam-se como genitais substitutivos. Os órgãos na histeria são simultaneamente funcionais e erógenos. A execução da função do órgão é perturbada pelo caráter erógeno do sintoma. Sobre a questão funcional e erógena dos órgãos na histeria,  Freud diz: “Inúmeras sensações e inervações  que encontramos como sintomas de histeria, em órgãos que não possuem conexão evidente com a sexualidade, revelam-se a nós, assim, como tendo o caráter de realização de impulsos sexuais pervertidos em relação aos quais outros órgãos adquiriram a significação das partes sexuais. Também verificamos em que graus os órgãos destinados à tomada de alimento e à excreção têm particular facilidade de se tornarem veículos de excitação sexual." A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)

Na Neurose obsessiva a  pressão de impulsos sexuais sádicos excessivamente intensos (pervertidos quanto ao seu fim). Os sintomas neste caso servem de defesa a esses impulsos, mas também produzem satisfação substituta. Esse impulso sexual sádico retorna à própria pessoa e realiza-se nos auto flagelamentos, ou nas auto recriminações. “Outras formas desta neurose, as formas cismáticas, correspondem a uma excessiva sexualização do querer olhar, tocar ou explorar. Aqui temos a explicação da grande importância do temor de tocar e da obsessão de lavar-se. Uma quantidade incrivelmente grande de atos obsessivos pode remontar a masturbação, da qual constituem repetições e modificações disfarçadas; sabe-se muito bem que a masturbação, embora sendo uma ação única e uniforme acompanha as mais diversas formas do fantasiar sexual.” A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)

O que são esses impulsos pervertidos da histeria ?
O que são esses impulsos sexuais sádicos da neurose obsessiva ?

O impulso sexual relacionado ao sintoma apresenta maior intensidade, do que aquele que adveio da satisfação sexual vivida através do sexo. Justamente porque o impulso sexual relacionado ao sintoma encontrou obstáculos. A dificuldade ou privação na realização sexual via  “normal” evidencia as inclinações perversas. As inclinações já existiam,  entretanto a necessidade de satisfaze-las só intensificou porque não encontrou meio de minimamente se realizar. Essa inclinação perversa poderia manter-se latente.

A sexualidade infantil:

2. A sexualidade ‘pervertida’ não seria senão uma sexualidade infantil cindida (dividida) em impulsos separados. 

O corpo do bebê é erotizado por aqueles que cuidam dele, a medida que falam, alimentam, banham o bebê. Esses investimentos pouco a pouco vão delimitando o corpo. “Supor que as crianças não têm vida sexual – excitações e necessidades sexuais e alguma forma de satisfação -, mas adquirem-na subitamente entre os doze e os quatorze anos de idade seria (abstraindo de todas as observações) biologicamente tão improvável e, na verdade, tão sem sentido como supor que viessem ao mundo desprovidas de genitais e que estes só aparecessem na época da puberdade. O que de fato desperta nas crianças nessa idade, é a função reprodutiva, que, para seus fins, faz uso dos componentes físicos e mentais já anteriormente presentes.” A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)


A sexualidade e reprodução são coisas completamente diferentes. A delimitação da adolescência como supostamente seria o início da sexualidade é uma convenção moral, medida educativa e protetiva a infância e aos adultos. "(...) Pois a sociedade deve assumir como uma de suas mais importantes tarefas educadoras domar e restringir a pulsão sexual  quando este irrompe como impulso a reprodução, e sujeita-lo a uma vontade individual que é idêntica à ordem da sociedade. Esta também se preocupa em adiar o pleno desenvolvimento do instinto até que a criança tenha atingido certo grau de maturidade intelectual, de vez que ai, com a completa irrupção da pulsão sexual, a educabilidade para fins práticos. Chega a seu fim. De outro modo as pulsões romperiam todos os diques e arrasariam todo o trabalho da civilização laboriosamente construído” A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)

Os adultos frente a sexualidade infantil:  Ao mesmo tempo negam a existência da sexualidade nas crianças mas se empenham em educar para retirar qualquer impulso que o intuito seja sexual:  as “traquinagens infantis”. Nos adultos existe a ideia da criança assexual.

O que Freud entende por sexualidade infantil? “Numa criança de tenra idade, os primeiros impulsos da sexualidade têm seu aparecimento ligado a outras funções vitais. Seu principal interesse como sabem volta-se para a ingestão de alimentos; quando as crianças adormecem, após se haverem saciado ao seio, mostram  uma expressão de bem aventurada satisfação, que se repetirá posteriormente na vida, após a experiência sexual.” A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)



PRIMEIRO: SATISFAÇÃO ORAL:  ALIMENTO + TOQUE NO SEIO/BOCA.

“Isto seria muito pouco para servir de base a uma conclusão. Constatamos, todavia, como um bebê repetirá o ato de tomar alimento sem exigir mais comida; a isto portanto, o bebê não é levado devido a fome. Descrevemo-lo como sucção sensual, e o fato de que ao faze-lo, o bebê adormece igualmente, com uma expressão beatífica, mostra-nos que o ato da sucção sensual lhe proporcionou por si só uma satisfação. Conforme sabemos, muito cedo as coisas chegam a um ponto em que não pode adormecer sem haver sugado.” A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)

SÓ DEPOIS: A SATISFAÇÃO PRAZEROSA ORAL ATRAVÉS DO TOQUE NO SEIO/BOCA SEM A NECESSIDADE DO ALIMENTO.

“Acreditamos que elas (as crianças) primeiro experimentam esse prazer em conexão com a tomada do alimento, porém logo aprendem a separar esse prazer da condição que o acompanha. Só podemos atribuir esse prazer a uma excitação das áreas da boca e dos lábios; a essas partes do corpo denominamos zonas erógenas e descrevemos como sexual o prazer derivado da sucção. Sem dúvida haveremos de discutir posteriormente, se esta descrição se justifica.” A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)

As duas necessidades satisfeitas simultaneamente: alimentação e o toque boca/seio materno funcionariam como protótipo da satisfação sexual, que acompanhará o sujeito pelo resto da vida. Na escolha dos outros objetos esse primeiro objeto será de grande valia, entretanto antes da busca por novos objetos, o bebê encontrará em si, em alguma parte do seu corpo a satisfação – autoerotismo. 

As zonas erógenas não são todas igualmente prazerosas como a oral, entretanto elas mapeiam o prazer no corpo. Os bebês ao mesmo tempo lidam com a busca e encontro de satisfação sexual através do corpo(zonas erógenas), mas também lidam com a rigidez por parte dos adultos na educação, ou a proibição  da  busca por  satisfação. “Para induzi-lo a renunciar a essas fontes de prazer, é-lhes dito que tudo aquilo que se relaciona com essas funções é vergonhoso e deve  ser  mantido em segredo. Então pela primeira vez a criança é obrigada a trocar o prazer pela respeitabilidade social.”A vida sexual dos seres humanos: S. Freud. Conferência XX (1916-1917)

O que ocorre com os impulsos e as excitabilidades sexuais presentes no corpo infantil? Muito disso sofrerá diversos destinos: recalque e posteriormente sintomas neurótico ou  servirão de protótipo na vida sexual adulta. 

As crianças pequeninas a princípio nada sabem sobre sexo, suas investigações sexuais iniciam muito cedo, muitas vezes antes do terceiro ano de vida.

Para as crianças pequenas a princípio só existe o sexo masculino, só mais tarde haverá a distinção entre os sexos masculino e feminino. Essa divisão se torna algo problemático: 

Aos meninos o pênis é algo precioso que as meninas perderam. A ameaça de serem castrados se torna relevante/risco quando descobrem a distinção entre os sexos. (complexo de castração) A maneira como o menino se posicionará frente a essas problemáticas trarão consequências a sua neurose e  a sua maneira de lidar com o sexo. 

Às meninas, a constatação da distinção entre os sexos, trará a inveja do pênis, sentindo-se em desvantagem frente aos meninos que apresentam o pênis maior. Até determinado momento, o clitóris funcionará às meninas como um pênis, só que menor. A primazia fálica e posteriormente a diferença anatômica entre os sexos, trará consequências na vida do menino e da menina.

O início das investigações sobre a sexualidade nas crianças se dá a partir da pergunta sobre sua origem: da onde nascem os bebês? A partir desta pergunta constrói hipóteses, dentro de seus limites de percepção.

O conceito de sexualidade em psicanálise foi ampliado: não é o sexo genital propriamente dito, mas são impulsos que investem em objetos, cujo a finalidade é a satisfação , sendo que, cada qual se satisfaz a sua maneira. A psicanálise tenta retirar o sexual das regras morais e dos padrões estabelecidos socialmente. 






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