Madame Bovary retrata essa
questão de maneira exemplar.
Resolvi também escrever sobre este filme porque o achei
extremamente atual e emblemático. Hoje em dia vivemos um tempo onde paira uma
insatisfação geral. As relações
estão cada dia mais superficiais e
“interesseiras” e parece que Madame Bovary se
relaciona desta maneira, com todos que a
cerca.
Outro ponto que me intrigou bastante neste filme foi
justamente o fato de Emma não se perguntar sobre o que deseja ou não deseja. Ela segue o fluxo, sem
responsabilidade, a fim de conquistar
algo que talvez nem queira de fato. Desloca-se
de objeto em objeto, sem algo que realmente chame sua atenção.
O marido de Emma por sua vez parece adormecido, na posição
de amado, “cego de amor". Seus gestos giram em torno de Tentar realizar
o que supõe que Emma deseja. Qual mulher esse homem ama? A quem Emma ama? O que desejam?
Este filme ilustra um
viés das relações amorosas que quase ninguém deseja ver, mas que estão ai nas
relações:
- Nem sempre o que pedimos é o que realmente queremos, aliás, geralmente pedimos o avesso daquilo que queremos.
- Por trás de nossos apelos existem tantos outros pedidos, que não são claros nem mesmo para cada um de nós.
- Nossas insatisfações são inerentes a nossa humanidade, não existindo um objeto (amoroso ou não) que nos satisfaça completamente.
“MADAME BOVARY” (1991)
Emma é uma jovem romântica e sonhadora, que vive no interior da França no Século 19. Um dia o Dr. Charles Bovary vai à fazenda da família para cuidar do pai de Emma. À medida que o médico cuida do pai interessa-se pela jovem, e Emma parece que vê neste homem uma oportunidade de tirá-la do tédio ao qual se encontra. Ao pai de Emma uma oportunidade de casamento para a filha e assim ocorre, Emma casa-se com Charles Bovary. Interessante como cada um deseja neste casamento coisa diferente: o pai um destino para a filha. Charles Bovary deseja amar e ser amado e Emma deseja sanar suas insatisfações advindas de suas idealizações.
Dr. Charles Bovary é um médico de província, sem grandes ambições, mas cheio de boas intenções. Como satisfazer
uma mulher insatisfeita? Como supor o querer da outra pessoa? Emma descobre que, apesar da dedicação do
marido, o casamento não é como havia idealizado. A impressão que dá é que
quanto mais o marido tenta satisfazer as vontades de Emma, mais ela se afasta
dele.
Enquanto o marido busca no
casamento ser amado por essa mulher. Emma parece que se desencontrou a partir do
casamento. Emma
queria ser retirada do tédio de ser mulher, numa época onde à elas cabia apenas
satisfazer os desejos do marido, cuidar dos afazeres domésticos e dos filhos
quando viessem. Emma não sabia o que queria, mas sabia que não queria estar
naquele lugar, cumprindo as tarefas que lhe eram reservadas: cuidar do marido e
filha, aliás, com a menina mantinha uma relação de desprezo. Emma na realidade parecia
sonhar em conquistar a evidência social através do marido médico para compensar
uma existência medíocre.
O casal é convidado a participar
de um baile na província em que residem. Ali naquele baile Emma percebe os
olhares de outros homens a ela. Este baile deflagra nesta mulher a ambição de
estar em outra posição, mais rica e poderosa, mas também de ser desejada por
outros homens. Ela descobre que pode ir além e encontrar a vida de brilho que
idealizou. Só que Emma conquistaria suas ambições através do crescimento profissional
e da visibilidade do marido enquanto médico, como também através da sedução de
outros homens. Engano de Emma: como transmitir suas ambições ao marido simples,
medíocre e satisfeito de sua posição?
Será que Emma realmente se
interessava por outros homens? Ou seduzia e era seduzida para sentir-se
especial ou desejada? Amada já era pelo marido e isso só a fazia despreza-lo. Quanto
mais insatisfeita, mais investia nos objetos que surgiam (homens, dinheiro,
roupas), mais se sentia insatisfeita e mais acumulava dividas.
A personagem através de suas buscas
ambiciosas em relação ao marido, e
aventuras amorosas perde progressivamente o sentido da realidade. Sua perdição
culmina quando não tem mais controle de sua vida e de suas dívidas alimentadas
por um agiota inescrupuloso. Emma atira-se num pote de arsênico e agoniza até a
morte.
O termo bovarismo entrou para o dicionário utilizado para designar “a tendência que certos indivíduos têm de fugir da realidade e imaginar para si uma personalidade e condições de vida que não possuem.”
Enfim, entre traições, amores
despedaçados, ódios reprimidos e momentos de alguma dor, "Madame
Bovary" coloca-nos perante um universo narrativo denso e sem perspectivas,
onde poucos personagens são capazes de gerar a nossa simpatia. Claude Chabrol
não tem contemplações para com a sua protagonista. É um filme emocionalmente
violento, que apresenta lados mais negros da humanidade, nem tem tréguas para
com os seus personagens.
Atriz Isabelle Huppert |
FICHA TÉCNICA:
Produtor: Marin Karmitz
Diretor: Claude
Chabrol
Roteiro: Claude
Chabrol, baseado no romance de Gustave Flaubert
Fotografia: Jean
Rabier
Direção de arte:
Michele Abbé-Vannier
Indicação ao Oscar de
Melhor figurino.
Indicação ao Globo de
Ouro de Melhor filme estrangeiro
Melhor Atriz (Isabelle Huppert) no Festival de Cinema
de Moscou
PAULA ADRIANA NEVES COUTO
PSICANALISTA
paulaadriana.couto@gmail.com
tel: (11) 9 7656-7297
Consultório: Av. Leôncio de Magalhães, 1138 - Jdim São Paulo
Próximo ao Metrô Jdim São Paulo
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