Cinco Lições de Psicanálise
De Sigmund Freud
Nesta terceira lição, Freud fala sobre a
linguagem nos diversos processos psíquicos. Em psicanalise a única regra utilizada
é a associação livre, que consiste no Analisando durante a analise falar
livremente, Freud diz que nesta livre
associação há intencionalidade. Nesta fala há ideias patógenas relacionadas ao
sintoma que surgem junto às ideias corriqueiras.
No conteúdo por vezes confuso que o
analisando apresenta existem duas forças antagônicas em ação: de um lado uma
força a trazer conteúdos inconscientes a consciência, e de outro lado
antagonicamente outra força que resiste justamente que esse conteúdo advenha.
Quanto maior for à deformação do elemento apresentado maior foi a resistência.
" O pensamento que no doente vinha em
lugar do desejado, tinha origem idêntica à de um sintoma; era uma nova
substituição artificial e efêmera do reprimido e tanto menos semelhante a ele
quanto maior a deformação que tivesse de sofrer sob a influência da
resistência. Ele devia mostrar, porém, certa parecença com o procurado, em
virtude da sua natureza de sintoma; e desde que a resistência não fosse muito
intensa, seria possível, partindo da ideia, distinguir o oculto que se buscava.
O pensamento devia comportar-se em relação ao elemento reprimido com uma alusão, como uma representação
do mesmo por meio de palavras indiretas." Freud S. Cinco lições de Psicanálise
Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)
Na associacao livre, nos sonhos, sintomas
e chistes há traços dos conteudos patógenos inconscientes. Os tracos não
são: palavras, histórias vividas, imagens, ou qualquer outra coisa neste
sentido de concretude. Um traço é um traço. E o sujeito faz uso disso. Afinal,
o que são traços?
O conceito de traço mnésico, segundo o dicionário de Psicanálise
(Chemama): “a teoria psicanalítica da neurose pressupõe uma atenção particular
quanto à forma pela qual os eventos vivenciados pelo sujeito, acontecimentos às
vezes traumáticos, podem subsistir nele (“os histéricos sofrem de reminiscências”).
Por isso a necessidade de conceber que são traços mnésicos, inscrições de
eventos que podem subsistir no pré-consciente ou no inconsciente, que são
reativados, quando investidos. Se, de fato, todos os traços da excitação
subsistissem na consciência, isso iria logo limitar a capacidade do sistema
para receber novas excitações: memória e consciência se excluem. Quanto ao que
é propriamente dito recalcado, também é preciso que ele subsista, sob a forma
de traço mnésico, visto que retorna no sonho ou no sintoma. Apesar de algumas formulações ambíguas de
Freud, o traço mnésico não é uma imagem da coisa, mas um simples sinal, que não
comporta uma qualidade sensorial particular e que pode, portanto, ser comparado
a um elemento de um sistema de escrita a uma letra.”
No aparelho psíquico, existem ideias
livres (soltas) que buscam ser descarregadas (conteúdos ideacionais, repletos
de carga de excitação), ao qual a Escola de Zurique (Jung, Bleuler) deu o nome
de "complexo". Sempre haverá este tipo de material, mesmo que por ação
da resistência, o analisando diga que não sabe mais o que dizer.
Surgem algumas perguntas: O rompimento com
Jung trouxe alguma consequencia a utilizacao da palavra complexo e seus conteúdos?
Esses complexos e os traços são os mesmos elementos? Essas ideias livres
(soltas) sempre existirão mesmo apos a analise? São destes conteúdos que o
inconsciente é constituído?
"No emprego desta técnica o que ainda
nos perturba é que com frequência o doente se detém, afirmando não saber dizer
mais nada, que nada mais lhe vem à ideia. Se assim fosse, se o doente tivesse
razão, o método ter-se-ia revelado impraticável. Uma observação atenta mostra,
contudo, que as ideias livres nunca deixam de aparecer. É que o doente,
influenciado pela resistência disfarçada em juízos críticos sobre o valor da
ideia, retém-na ou de novo a afasta. Para evitá-la põe-se previamente o doente
a par do que pode ocorrer, pedindo-lhe renuncie a qualquer crítica; sem nenhuma
seleção deverá expor tudo que lhe vier ao pensamento, mesmo que lhe pareça
errôneo, despropositado ou absurdo e, especialmente, se lhe for desagradável a
vinda dessas ideias à mente. Pela observância dessa regra garantimo-nos o
material que nos conduz ao roteiro do complexo reprimido." Freud S. Cinco lições
de Psicanálise Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)
Freud segue sua “lição” abordando os
sonhos, e a sua interpretação como possibilidade de acesso ao inconsciente.
Talvez neste momento Freud esteja contagiado pelas ideias de Jung sobre os sonhos,
ou não se deu conta da importância da presença do analista/transferência. Freud
pelo menos nesta parte do texto parece acreditar que é possível a autoanalise:
"Quando me perguntam como pode uma
pessoa fazer-se psicanalista, respondo que é pelo estudo dos próprios sonhos.
Os adversários da psicanálise, com muita habilidade, têm até agora evitado
estudar de perto “A Interpretação de Sonhos”, ou têm oposto ao de longe
objeções superficialíssimas. Se não repugna aos presentes, ao contrário,
aceitar as soluções dos problemas da vida onírica, já não apresentam aos
ouvintes dificuldade alguma as novidades trazidas pela psicanálise." Freud
S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund Freud - TERCEIRA
LIÇÃO. (1909)
As elaborações oníricas noturnas são
semelhantes tanto àqueles que apresentam problemas psíquicos ou daqueles
sujeitos dito “normais”. Talvez a diferença entre o sujeito com problemas
psíquicos está no despertar e não no sonhar. Sobre essas semelhanças Freud diz:
“Não é nenhum paradoxo afirmar que quem fica
admirado ante essas alucinações, delírios ou mudanças de caráter que podemos
chamar “normais”, sem procurar explicá-los, não tem a menor probabilidade de
compreender, senão como qualquer leigo as formações anormais dos estados
psíquicos patológicos. E entre esses leigos os ouvintes podem contar
atualmente, sem receio, quase todos os psiquiatras." Freud S. Cinco lições
de Psicanálise Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)
Os sonhos sempre tiveram um caráter
exótico, até porque geralmente são obscuros. Até hoje algumas pessoas acreditam
no seu caráter profético ou oracular, numa suposta simbologia. Freud escreveu a
Interpretação dos sonhos (1905), neste extenso livro o autor aborda os diversos
aspectos dos sonhos e sua interpretação. Freud diz inclusive que os sonhos são
realização de desejo.
“Em primeiro lugar, nem todos os sonhos
são estranhos, incompreensíveis e confusos para a pessoa que sonhou. Examinando
os sonhos de criancinhas, desde um ano e meio de idade, verificarão que eles
são extremamente simples e de fácil explicação. A criancinha sonha sempre com a
realização de desejos que o dia anterior lhe trouxe e que ela não satisfez. Não
há necessidade de arte divinatória para encontrar solução tão simples; basta
saber o que se passou com a criança na véspera ("dia do sonho").
Estaria certamente resolvido, e de modo satisfatório, o enigma do sonho, se o
do adulto não fosse nada mais que o da criancinha: realização de desejos
trazidos pelo dia do sonho. E o é de fato. As dificuldades que esta solução apresenta
removem-se uma a uma, mediante a análise minuciosa dos sonhos.” Freud S. Cinco
lições de Psicanálise Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)
Os sonhos dos adultos apresentam
geralmente conteúdo ininteligível que não são satisfação (realização ou
satisfação?) de desejos, neste textos dos sonhos há certa distorção, o que
torna o sonho obscuro, mas também enigmático e que nos instiga a querer saber
mais.
Nos sonhos existem os conteúdos latentes e
os manifestos. “O conteúdo
manifesto do sonho, recordado vagamente de manhã e que, não obstante a
espontaneidade aparente, se exprime em palavras com esforço, deve ser
diferenciado dos pensamentos
latentes do sonho que se têm
de admitir como existentes no inconsciente. Esta deformação possui mecanismo
idêntico ao que já conhecemos desde quando examinamos a gênese dos sintomas
histéricos; e é uma prova da participação da mesma interação de forças mentais
tanto na formação dos sonhos como na dos sintomas. O conteúdo manifesto do
sonho é o substituto deformado para os pensamentos inconscientes do sonho. Esta
deformação é obra das forças defensivas do eu, isto é, das resistências que na
vigília impedem, de modo geral, a passagem para a consciência, dos desejos
reprimidos do inconsciente; enfraquecidas durante o sono, estas resistências
ainda são suficientemente fortes para só os tolerar disfarçados. Quem sonha,
portanto, reconhece tão mal o sentido de seus sonhos, como o histérico as
correlações e a significação de seus sintomas.” Freud S. Cinco lições de
Psicanálise Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)
Em análise, o analisando narra o sonho,
utilizando-se de elementos da sua memória, criando um texto, como na associação
livre. O analista por sua vez parte da
narrativa do sonho como um todo, mas principalmente de cada um dos elementos do
sonho manifesto. Deste material chega-se aos pensamentos latentes do sonho.
Enfim nos conteúdos manifestos dos sonhos dos adultos há: conteúdos deformados
(ação da censura), impressões do dia anterior e há também realização de desejo
inconsciente.
“O sonho manifesto que conhecem no adulto
graças à recordação pode então ser descrito como uma realização velada de desejos recalcados”. Freud S. Cinco
lições de Psicanálise Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)
Nas elaborações oníricas há dois processos
psíquicos envolvidos: a condensação e o deslocamento. A elaboração onírica é
resultado da divisão psíquica entre consciente e inconsciente. Freud assemelha
o trabalho de elaboração onírica nos sonhos aos sintomas, ambos como resultado
da divisão psíquica, num trabalho de deformação. Nos sintomas, aquele conteúdo
ideacional patógeno (complexos) advém de maneira deformada, quando o processo
de recalque fracassa. Será que o recalque por vezes fracassa e por isso aquele
conteúdo advém? Ou será que o recalque é construído para fracassar? Ou seja, o
conteúdo inconsciente necessita advir à consciência?
As
impressões da tenra infância exercem grande influência na vida do sujeito.
Impressões essas, que o sujeito fará uso: para reviver o passado? Para
prolongar uma satisfação já vivida? Revive porque não tem saída é necessário ao
aparelho psíquico reviver essas impressões?
Existe certa simbologia nos sonhos, que
por vezes parecem fixas, mas que o sujeito faz uso dela. Os signos
Nós geralmente perguntamos: como explicar
a realização de desejo nos pesadelos, ou nos sonhos penosos? Não podemos
esquecer que há conflito entre as instâncias, por vezes aquilo que é penoso à
consciência é sentido como prazeroso ao inconsciente. O que é prazeroso ao
inconsciente?
Mesmo nos pesadelos, há o sonho como um
todo, uma narrativa, mas há cada
elemento do sonho. O que torna o sonho um pesadelo? É a impressão que este nos
causa quando lembramos? Por vezes há sonhos com imagens impactantes, que não
nos afetam.
Freud fala da Ansiedade que surge quando
temos pesadelos: “Além de que é necessário interpretar os pesadelos antes de
sobre eles poder firmar qualquer juízo, pode dizer-se de modo geral que a
ansiedade que os acompanha não depende assim tão simplesmente do conteúdo
onírico, como muitos imaginam por ignorar as condições da ansiedade neurótica.
A ansiedade é uma das reações do eu contra desejos recalcados violentos, e daí
perfeitamente explicável a presença dela no sonho, quando a elaboração deste se
pôs excessivamente a serviço da satisfação daqueles desejos reprimidos.” Freud
S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund Freud - TERCEIRA
LIÇÃO. (1909)
Freud aborda então os esquecimentos de
nomes próprios, os lapsos de linguagem (escrita, leitura e na fala), os atos e
gestos que as pessoas fazem sem perceber e sem lhe dar importância. Esses atos exprimem
impulsos e intenções que devem ficar ocultos à consciência. Podem ser oriundos
de desejos recalcados ou dos complexos (conteúdos ideacionais, com intensa
carga de excitação). Como já foi dito, são esses elementos que são criadores
dos sintomas e formadores dos sonhos.
“Se
os ouvintes reunirem os meios que estão ao nosso alcance para descobrimento do
que na vida psíquica jaz escondido, deslembrado e reprimido — o estudo das ideias
livremente associadas pelos pacientes, seus sonhos, falhas e ações
sintomáticas; se ainda juntarem a tudo isso o exame de outros fenômenos
surgidos no decurso do tratamento psicanalítico e a respeito dos quais farei
algumas observações quando tratar da "transferência" — chegarão
comigo à conclusão de que a nossa técnica já é suficientemente capaz de
realizar aquilo que se propôs: conduzir à consciência o material psíquico
patogênico, dando fim desse modo aos padecimentos ocasionados pela produção dos
sintomas de substituição. O fato de enriquecermos e aprofundarmos durante o
tratamento os nossos conhecimentos sobre a vida mental, dos sãos e dos doentes,
deve ser considerado apenas como estímulo especial a este trabalho e uma de
suas vantagens.” Freud S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)
Pronunciadas por ocasião das comemorações
do vigésimo aniversário da Fundação da Clark University, Worcester,
Massachusetts, setembro de 1909
Tradução de Durval Marcondes e J. Barbosa
corra, revista e modificada por Jayme Salomão
(Do Livro: Os Pensadores, Abril Cultural,
1974, págs. 11 a 44)
Um sonho pode ser representado:
PAULA ADRIANA NEVES COUTO
Psicanalista clínica
Email: paulaadriana.couto@gmail.com
Telefone: 3715-8494
Consultório: Av. Leôncio de Magalhães, 1138 - Jdim São Paulo