terça-feira, 13 de outubro de 2015

Minha leitura e muitas perguntas sobre:Cinco lições de Psicanálise (1909) - Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO.

Cinco Lições de Psicanálise
De Sigmund Freud


Nesta terceira lição, Freud fala sobre a linguagem nos diversos processos psíquicos. Em psicanalise a única regra utilizada é a associação livre, que consiste no Analisando durante a analise falar livremente,  Freud diz que nesta livre associação há intencionalidade. Nesta fala há ideias patógenas relacionadas ao sintoma que surgem junto às ideias corriqueiras.

No conteúdo por vezes confuso que o analisando apresenta existem duas forças antagônicas em ação: de um lado uma força a trazer conteúdos inconscientes a consciência, e de outro lado antagonicamente outra força que resiste justamente que esse conteúdo advenha. Quanto maior for à deformação do elemento apresentado maior foi a resistência.

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" O pensamento que no doente vinha em lugar do desejado, tinha origem idêntica à de um sintoma; era uma nova substituição artificial e efêmera do reprimido e tanto menos semelhante a ele quanto maior a deformação que tivesse de sofrer sob a influência da resistência. Ele devia mostrar, porém, certa parecença com o procurado, em virtude da sua natureza de sintoma; e desde que a resistência não fosse muito intensa, seria possível, partindo da ideia, distinguir o oculto que se buscava. O pensamento devia comportar-se em relação ao elemento reprimido com uma alusão, como uma representação do mesmo por meio de palavras indiretas."  Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)

Na associacao livre, nos sonhos, sintomas e chistes há traços dos conteudos patógenos inconscientes. Os tracos não são: palavras, histórias vividas, imagens, ou qualquer outra coisa neste sentido de concretude. Um traço é um traço. E o sujeito faz uso disso. Afinal, o que são traços?

O conceito de traço mnésico, segundo o dicionário de Psicanálise (Chemama): “a teoria psicanalítica da neurose pressupõe uma atenção particular quanto à forma pela qual os eventos vivenciados pelo sujeito, acontecimentos às vezes traumáticos, podem subsistir nele (“os histéricos sofrem de reminiscências”). Por isso a necessidade de conceber que são traços mnésicos, inscrições de eventos que podem subsistir no pré-consciente ou no inconsciente, que são reativados, quando investidos. Se, de fato, todos os traços da excitação subsistissem na consciência, isso iria logo limitar a capacidade do sistema para receber novas excitações: memória e consciência se excluem. Quanto ao que é propriamente dito recalcado, também é preciso que ele subsista, sob a forma de traço mnésico, visto que retorna no sonho ou no sintoma. Apesar de algumas formulações ambíguas de Freud, o traço mnésico não é uma imagem da coisa, mas um simples sinal, que não comporta uma qualidade sensorial particular e que pode, portanto, ser comparado a um elemento de um sistema de escrita a uma letra.”

No aparelho psíquico, existem ideias livres (soltas) que buscam ser descarregadas (conteúdos ideacionais, repletos de carga de excitação), ao qual a Escola de Zurique (Jung, Bleuler) deu o nome de "complexo". Sempre haverá este tipo de material, mesmo que por ação da resistência, o analisando diga que não sabe mais o que dizer.

Surgem algumas perguntas: O rompimento com Jung trouxe alguma consequencia a utilizacao da palavra complexo e seus conteúdos? Esses complexos e os traços são os mesmos elementos? Essas ideias livres (soltas) sempre existirão mesmo apos a analise? São destes conteúdos que o inconsciente é constituído?

"No emprego desta técnica o que ainda nos perturba é que com frequência o doente se detém, afirmando não saber dizer mais nada, que nada mais lhe vem à ideia. Se assim fosse, se o doente tivesse razão, o método ter-se-ia revelado impraticável. Uma observação atenta mostra, contudo, que as ideias livres nunca deixam de aparecer. É que o doente, influenciado pela resistência disfarçada em juízos críticos sobre o valor da ideia, retém-na ou de novo a afasta. Para evitá-la põe-se previamente o doente a par do que pode ocorrer, pedindo-lhe renuncie a qualquer crítica; sem nenhuma seleção deverá expor tudo que lhe vier ao pensamento, mesmo que lhe pareça errôneo, despropositado ou absurdo e, especialmente, se lhe for desagradável a vinda dessas ideias à mente. Pela observância dessa regra garantimo-nos o material que nos conduz ao roteiro do complexo reprimido." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)

Freud segue sua “lição” abordando os sonhos, e a sua interpretação como possibilidade de acesso ao inconsciente. Talvez neste momento Freud esteja contagiado pelas ideias de Jung sobre os sonhos, ou não se deu conta da importância da presença do analista/transferência. Freud pelo menos nesta parte do texto parece acreditar que é possível a autoanalise:
"Quando me perguntam como pode uma pessoa fazer-se psicanalista, respondo que é pelo estudo dos próprios sonhos. Os adversários da psicanálise, com muita habilidade, têm até agora evitado estudar de perto “A Interpretação de Sonhos”, ou têm oposto ao de longe objeções superficialíssimas. Se não repugna aos presentes, ao contrário, aceitar as soluções dos problemas da vida onírica, já não apresentam aos ouvintes dificuldade alguma as novidades trazidas pela psicanálise." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)

As elaborações oníricas noturnas são semelhantes tanto àqueles que apresentam problemas psíquicos ou daqueles sujeitos dito “normais”. Talvez a diferença entre o sujeito com problemas psíquicos está no despertar e não no sonhar. Sobre essas semelhanças Freud diz:
“Não é nenhum paradoxo afirmar que quem fica admirado ante essas alucinações, delírios ou mudanças de caráter que podemos chamar “normais”, sem procurar explicá-los, não tem a menor probabilidade de compreender, senão como qualquer leigo as formações anormais dos estados psíquicos patológicos. E entre esses leigos os ouvintes podem contar atualmente, sem receio, quase todos os psiquiatras." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)

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Os sonhos sempre tiveram um caráter exótico, até porque geralmente são obscuros. Até hoje algumas pessoas acreditam no seu caráter profético ou oracular, numa suposta simbologia. Freud escreveu a Interpretação dos sonhos (1905), neste extenso livro o autor aborda os diversos aspectos dos sonhos e sua interpretação. Freud diz inclusive que os sonhos são realização de desejo.

“Em primeiro lugar, nem todos os sonhos são estranhos, incompreensíveis e confusos para a pessoa que sonhou. Examinando os sonhos de criancinhas, desde um ano e meio de idade, verificarão que eles são extremamente simples e de fácil explicação. A criancinha sonha sempre com a realização de desejos que o dia anterior lhe trouxe e que ela não satisfez. Não há necessidade de arte divinatória para encontrar solução tão simples; basta saber o que se passou com a criança na véspera ("dia do sonho"). Estaria certamente resolvido, e de modo satisfatório, o enigma do sonho, se o do adulto não fosse nada mais que o da criancinha: realização de desejos trazidos pelo dia do sonho. E o é de fato. As dificuldades que esta solução apresenta removem-se uma a uma, mediante a análise minuciosa dos sonhos.” Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)

Os sonhos dos adultos apresentam geralmente conteúdo ininteligível que não são satisfação (realização ou satisfação?) de desejos, neste textos dos sonhos há certa distorção, o que torna o sonho obscuro, mas também enigmático e que nos instiga a querer saber mais.
Nos sonhos existem os conteúdos latentes e os manifestos. “O conteúdo manifesto do sonho, recordado vagamente de manhã e que, não obstante a espontaneidade aparente, se exprime em palavras com esforço, deve ser diferenciado dos pensamentos latentes do sonho que se têm de admitir como existentes no inconsciente. Esta deformação possui mecanismo idêntico ao que já conhecemos desde quando examinamos a gênese dos sintomas histéricos; e é uma prova da participação da mesma interação de forças mentais tanto na formação dos sonhos como na dos sintomas. O conteúdo manifesto do sonho é o substituto deformado para os pensamentos inconscientes do sonho. Esta deformação é obra das forças defensivas do eu, isto é, das resistências que na vigília impedem, de modo geral, a passagem para a consciência, dos desejos reprimidos do inconsciente; enfraquecidas durante o sono, estas resistências ainda são suficientemente fortes para só os tolerar disfarçados. Quem sonha, portanto, reconhece tão mal o sentido de seus sonhos, como o histérico as correlações e a significação de seus sintomas.” Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)

Em análise, o analisando narra o sonho, utilizando-se de elementos da sua memória, criando um texto, como na associação livre.  O analista por sua vez parte da narrativa do sonho como um todo, mas principalmente de cada um dos elementos do sonho manifesto. Deste material chega-se aos pensamentos latentes do sonho. Enfim nos conteúdos manifestos dos sonhos dos adultos há: conteúdos deformados (ação da censura), impressões do dia anterior e há também realização de desejo inconsciente.

“O sonho manifesto que conhecem no adulto graças à recordação pode então ser descrito como uma realização velada de desejos recalcados”. Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)

Nas elaborações oníricas há dois processos psíquicos envolvidos: a condensação e o deslocamento. A elaboração onírica é resultado da divisão psíquica entre consciente e inconsciente. Freud assemelha o trabalho de elaboração onírica nos sonhos aos sintomas, ambos como resultado da divisão psíquica, num trabalho de deformação. Nos sintomas, aquele conteúdo ideacional patógeno (complexos) advém de maneira deformada, quando o processo de recalque fracassa. Será que o recalque por vezes fracassa e por isso aquele conteúdo advém? Ou será que o recalque é construído para fracassar? Ou seja, o conteúdo inconsciente necessita advir à consciência?

As impressões da tenra infância exercem grande influência na vida do sujeito. Impressões essas, que o sujeito fará uso: para reviver o passado? Para prolongar uma satisfação já vivida? Revive porque não tem saída é necessário ao aparelho psíquico reviver essas impressões?

Existe certa simbologia nos sonhos, que por vezes parecem fixas, mas que o sujeito faz uso dela. Os signos

Nós geralmente perguntamos: como explicar a realização de desejo nos pesadelos, ou nos sonhos penosos? Não podemos esquecer que há conflito entre as instâncias, por vezes aquilo que é penoso à consciência é sentido como prazeroso ao inconsciente. O que é prazeroso ao inconsciente? 

Mesmo nos pesadelos, há o sonho como um todo, uma narrativa,  mas há cada elemento do sonho. O que torna o sonho um pesadelo? É a impressão que este nos causa quando lembramos? Por vezes há sonhos com imagens impactantes, que não nos afetam.

Freud fala da Ansiedade que surge quando temos pesadelos: “Além de que é necessário interpretar os pesadelos antes de sobre eles poder firmar qualquer juízo, pode dizer-se de modo geral que a ansiedade que os acompanha não depende assim tão simplesmente do conteúdo onírico, como muitos imaginam por ignorar as condições da ansiedade neurótica. A ansiedade é uma das reações do eu contra desejos recalcados violentos, e daí perfeitamente explicável a presença dela no sonho, quando a elaboração deste se pôs excessivamente a serviço da satisfação daqueles desejos reprimidos.” Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)


Freud aborda então os esquecimentos de nomes próprios, os lapsos de linguagem (escrita, leitura e na fala), os atos e gestos que as pessoas fazem sem perceber e sem lhe dar importância. Esses atos exprimem impulsos e intenções que devem ficar ocultos à consciência. Podem ser oriundos de desejos recalcados ou dos complexos (conteúdos ideacionais, com intensa carga de excitação). Como já foi dito, são esses elementos que são criadores dos sintomas e formadores dos sonhos.

 “Se os ouvintes reunirem os meios que estão ao nosso alcance para descobrimento do que na vida psíquica jaz escondido, deslembrado e reprimido — o estudo das ideias livremente associadas pelos pacientes, seus sonhos, falhas e ações sintomáticas; se ainda juntarem a tudo isso o exame de outros fenômenos surgidos no decurso do tratamento psicanalítico e a respeito dos quais farei algumas observações quando tratar da "transferência" — chegarão comigo à conclusão de que a nossa técnica já é suficientemente capaz de realizar aquilo que se propôs: conduzir à consciência o material psíquico patogênico, dando fim desse modo aos padecimentos ocasionados pela produção dos sintomas de substituição. O fato de enriquecermos e aprofundarmos durante o tratamento os nossos conhecimentos sobre a vida mental, dos sãos e dos doentes, deve ser considerado apenas como estímulo especial a este trabalho e uma de suas vantagens.” Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - TERCEIRA LIÇÃO. (1909)



Pronunciadas por ocasião das comemorações do vigésimo aniversário da Fundação da Clark University, Worcester, Massachusetts, setembro de 1909
Tradução de Durval Marcondes e J. Barbosa corra, revista e modificada por Jayme Salomão
(Do Livro: Os Pensadores, Abril Cultural, 1974, págs. 11 a 44)


 Um sonho pode ser representado:



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PAULA  ADRIANA NEVES COUTO
Psicanalista clínica
Email: paulaadriana.couto@gmail.com
Telefone: 3715-8494
Consultório: Av. Leôncio de Magalhães, 1138 - Jdim São Paulo

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

ARTE

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A beleza expressa pelo artista não pode despertar em nós uma emoção que é cinética, ou uma emoção que é puramente física. Ela desperta ou deve despertar, ou induz, ou deve induzir, um êxtase estético, uma piedade ideal ou terror ideal, um êxtase que perdura, que se prolonga e que acaba, por fim, dissolvido pelo que eu chamo ritmo de beleza. (James Joyce, Retrato do Artista quando Jovem)

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Minha perspectiva e perguntas: Cinco lições de Psicanálise (1909) Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO

Cinco Lições de Psicanálise
De Sigmund Freud

SEGUNDA LIÇÃO
Na segunda lição, Freud continua abordando os mecanismos  da histeria, mas agora sob a perspectiva de  Charcot, Janet, Breuer e as suas próprias concepções.

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Charcot não era propenso as concepções psicológicas, para ele os  traumas histéricos de origem psíquica eram equivalentes aos traumas físicos. Já Pierre Janet, discípulo de Charcot articulou os mecanismos da histeria com os aspectos psíquicos e físicos envolvidos. Hipóteses de Janet: divisão psíquica e dissociação da personalidade.  Janet parte de duas visões ao abordar a histeria: o papel da hereditariedade e da degeneração. Neste autor a  histeria é uma forma de alteração degenerativa do sistema nervoso, que se manifesta pela fraqueza congênita do poder de síntese psíquica. O que isso significa?  Freud explica:

"Os pacientes histéricos seriam, desde o princípio, incapazes de manter com um todo a multiplicidade dos processos psíquicos, e daí a dissociação psíquica." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

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Exemplo citado  por Freud  sobre  dissociação psíquica descrita por Janet:
"Se me for permitida uma comparação trivial mais precisa, direi que o paciente histérico de Janet lembra uma pobre mulher que saiu a fazer compras e volta carregada de pacotes. Não podendo só com dois braços e dez dedos conter toda a pilha, cai-lhe primeiro um embrulho; ao inclinar-se para levantá-lo, cai-lhe outro, e assim sucessivamente. Contrariando, porém, esta suposta fraqueza mental dos pacientes histéricos, podem observar-se neles, além dos fenômenos de capacidade diminuída, outros, por assim dizer compensadores, de exaltação parcial da eficiência." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909) Continua Freud explicando a dissociação  psíquica, agora, a partir da paciente  do Dr. Breuer:  "Durante o tempo em que a doente de Breuer esquecera a língua materna e outros idiomas exceto o inglês, era tal a facilidade com que falava este último, que chegava a ponto de ser capaz, diante de um livro alemão, de traduzi-lo à primeira vista, perfeita e corretamente." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

Enfim, na dissociação psíquica estariam envolvidos mecanismos como: a memória, esquecimento  e seus contrários: rememoração e  lembranças.   Esses elementos utilizados  de maneira seletiva, a  favor da própria dissociação.  Interessante pensar a memória como algo disponível ao trabalho psíquico. Eu pensava a memória como algo totalmente orgânico e fixo.

Freud parte suas pesquisas da dissociação histérica, para chegar a divisão da consciência. O psiquismo é constituído de três instâncias ics-cs-pcs (Primeira tópica), sendo que essas instâncias atuam de maneira conflituosa. Aquilo que é insuportável à consciência torna-se inconsciente. E a memória estaria a  serviço  destas instancias, visando evitar  o aumento de  tensão no  aparelho psíquico,  decorrente do  conflito  entre os conteúdos.

Dr. Breuer através da utilização da hipnose com seus doentes  percebeu  que era possível diminuir a dissociação psíquica, e consequentemente alcançar rememoração do evento  traumático, o  extravasamento do quantum afetivo que  foi subjugado,  e  finalmente  a  catarse que levavam o doente ao apaziguamento de seus sintomas. Freud por sua vez buscou outro método para  trabalhar com suas  doentes, pois a hipnose não foi um  procedimento que ele se adaptou. Será que sem a hipnose seria possível rememorar, ou diminuir a  dissociação  ou se ter acesso  as ligações patogênicas? Ou  a própria  catarse?

"Como não podia modificar à vontade o estado psíquico dos doentes, procurei agir mantendo-os em estado normal. Parecia isto a princípio empresa insensata e sem probabilidade de êxito. Tratava-se de fazer o doente contar aquilo que ninguém, nem ele mesmo, sabia. Como esperar consegui-lo? O auxílio me veio da recordação de uma experiência de Bernheim, singularíssima e instrutiva, a que eu assistira em Nancy [em 1889]. Bernheim nos havia então mostrado que as pessoas por ele submetidas ao sonambulismo hipnótico e que nesse estado tinham executado atos diversos, só aparentemente perdiam a lembrança dos fatos ocorridos, sendo possível despertar nelas tal lembrança, mesmo no estado normal. Quando interrogadas a propósito do que havia acontecido durante o sonambulismo, afirmavam de começo nada saber; mas se ele não cedia, insistindo com elas e assegurando-lhes que era possível lembrar, a recordação vinha sempre de novo à consciência. Procedi do mesmo modo com os meus doentes. Quando chegávamos a um ponto em que nos afirmavam nada mais saber, assegurava-lhes que sabiam, que só precisavam dizer, e ia mesmo até afirmar que a recordação exata seria a que lhes apontasse no momento em que lhes pusesse a mão sobre a fronte." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

O saber sobre as doenças e as possibilidades de tratamento e suposta cura – até este momento (1909) era  um  privilegio dos  médicos, Freud  subverte essa ideia quando diz ao doente que ele sabe de  si, do seu mal estar, apesar de ignorar que sabe.

Apesar de o doente ser "sabido"  daquilo que o faz adoecer e que bastava um quantum de esforço para rememorar, existia algo nele que não queria saber sobre os seu mal estar. Freud então descobre a resistência: "Vi confirmado, assim, que as recordações esquecidas não se haviam perdido. Jaziam em poder do doente e pronta a ressurgir em associação com os fatos ainda sabidos, mas alguma força as detinha, obrigando-as a permanecer inconsciente." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

A resistência é uma força que mantém  a lembrança patogênica inacessível (inconsciente), trata-se da mesma forca que faz o caminho inverso:  expulsa da consciência o patógeno, através da  ação do recalque. Qual é esse agente patógeno? Por que os agentes patógenos devem ser expulsos da consciência?  "Trata-se em todos os casos do aparecimento de um desejo violento, mas em contraste com os demais desejos do indivíduo e incompatível com as aspirações morais e estéticas da própria personalidade. Produzia-se um rápido conflito e o desfecho desta luta interna era sucumbir ao recalque a ideia que aparecia na consciência trazendo em si o desejo inconciliável, sendo a mesma expulsa da consciência e esquecida, juntamente com as respectivas lembranças." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

Exemplo:  "A paciente era uma jovem que perdera recentemente o pai, depois de tomar parte, carinhosamente, nos cuidados ao enfermo — situação análoga à da doente de Breuer. Nascera, quando a irmã mais velha se casou, uma simpatia particular para o novo cunhado, que se mascarava por disfarce de ternura familiar. Esta irmã adoeceu logo depois e veio a falecer durante a ausência da minha doente e de sua mãe. Estas foram chamadas urgentemente, sem notícia completa do doloroso acontecimento. Quando a moça chegou ao leito da morta, correu-lhe na mente, por um rápido instante, uma ideia mais ou menos assim: "Ele agora está livre, pode desposar-me." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

Há desejo  proibido inconciliável entre as instancias: desejo sexual pelo cunhado, marido da irmã. A ideia que surge: “Ele agora está livre e pode desposar-me” é recalcada  (demonstra o desejo/a possibilidade de realizar).
A ideia que surge é recalcada e a mulher adoece: "A jovem adoeceu com graves sintomas histéricos e quando comecei a tratá-la tinha esquecido não só aquela cena junto ao leito da irmã, como também o concomitante sofrimento indigno e egoísta. Mas recordou-se de tudo durante o tratamento, reproduziu o incidente patogênico com sinais de intensa emoção, e curou-se." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

RELAÇÃO RECALQUE E  RESISTÊNCIA

 "Imaginem que nesta sala e neste auditório, cujo silêncio e cuja atenção eu não saberia louvar suficientemente, se acha no entanto um indivíduo comportando-se de modo inconveniente, perturbando-nos com risotas, conversas e batidas de pé, desviando-me a atenção de minha incumbência. Declaro não poder continuar assim a exposição; diante disso alguns homens vigorosos dentre os presentes se levantam, e após ligeira luta põem o indivíduo fora da porta. Ele está agora "reprimido" e posso continuar minha exposição. Para que, porém, se não repita o incômodo se o elemento perturbador tentar penetrar novamente na sala, os cavalheiros que me satisfizeram a vontade levam as respectivas cadeiras para perto da porta e, consumada a repressão, se postam como "resistências". Se traduzirmos agora os dois lugares, sala e vestíbulo, para a psique, como "consciente" e "inconsciente", os senhores terão uma imagem mais ou menos perfeita do processo de repressão." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

Confusão na tradução: Freud em seu texto utiliza repressão quando quer dizer recalque, é isso mesmo? Qual a diferença entre recalque e repressão? Recalque e repressão são conceitos utilizados com clareza por Freud em seus escritos na língua alemã. Porém, a interpretação dos tradutores disseminou no campo psicanalítico divergências em relação ao significado e utilização desta terminologia.  Em alemão se escreve Verdrängung, do verbo verdrängen. Segundo Hans (1996), a palavra é traduzida por recalque ou repressão.

Em Freud a  divisão psíquica  é  decorrente de um conflito entre  forças psíquicas  contrárias, uma luta ativa da parte dos dois agrupamentos psíquicos, esses conflitos são frequentes, mas  nem todo conflito psíquico leva a divisão. São necessárias condições para  resultar a divisão. 

Surgem novas questões sobre recalque e sintoma: Como do recalque advém o sintoma? O sintoma esta relacionado aquilo que foi recalcado? Por que algo que foi recalcado transforma-se em sintoma? A ideia do recalque não seria justamente manter este elemento fora da consciência? Ou não?

Freud e seus exemplos maravilhosos, agora sobre o recalque e sintoma: "Suponhamos que com a expulsão do perturbador e com a guarda à porta não terminou o incidente. Pode muito bem ser que o sujeito, irritado e sem nenhuma consideração, continue a nos dar que fazer. Ele já não está aqui conosco; ficamos livres de sua presença, dos motejos, dos apartes, mas a expulsão foi por assim dizer inútil, pois lá de fora ele dá um espetáculo insuportável, e com berros e murros na porta nos perturba a conferência mais do que antes. Em tais conjunturas poderíamos felicitar-nos se o nosso honrado presidente, Dr. Stanley Hall, quisesse assumir o papel de medianeiro e pacificador. Iria parlamentar com o nosso intratável companheiro e voltaria pedindo-nos que o recebêssemos de novo, garantindo-nos um comportamento conveniente daqui por diante. Graças à autoridade do Dr. Hall, condescendemos em desfazer a repressão, voltando a paz e o sossego. Eis uma representação muito apropriada da missão que cabe ao médico na terapêutica psicanalítica das neuroses." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

"Agora, para dizê-lo sem rebuços: chegamos à convicção, pelo exame dos doentes histéricos e outros neuróticos, de que o recalque das ideias, a que o desejo insuportável está apenso, malogrou. Expeliram-nas da consciência e da lembrança; com isso os pacientes se livraram aparentemente de grande soma de dissabores. Mas o impulso desejoso continua a existir no inconsciente à espreita de oportunidade para se revelar, concebe a formação de um substituto do recalcado, disfarçado e irreconhecível, para lançar à consciência, substituto ao qual logo se liga a mesma sensação de desprazer que se julgava evitada pela repressão. Esta substituição da ideia reprimida — o sintoma — é protegida contra as forças defensivas do eu e em lugar do breve conflito, começa então um sofrimento interminável. No sintoma, a par dos sinais do disfarce, podem reconhecer-se traços de semelhança com a ideia primitivamente recalcada. Pelo tratamento psicanalítico desvenda-se o trajeto ao longo do qual se realizou a substituição, e para a recuperação é necessário que o sintoma seja reconduzido pelo mesmo caminho até a ideia recalcada." Freud S. Cinco lições de Psicanálise   Sigmund Freud - SEGUNDA LIÇÃO. (1909)

Uma vez restituído à atividade psiquica consciente aquilo que fora recalcada —  resistências foram desfeitas — o conflito psíquico que desse modo se originara e que o doente quis evitar, alcança, orientado pelo médico, uma solução mais feliz do que a oferecida pelo recalque. Há várias dessas soluções para rematar satisfatoriamente conflito e neurose as quais, em determinados casos, podem combinar-se entre si:
-  A personalidade do doente se convence de que repelira sem razão o desejo e consente em aceitá-lo total ou parcialmente.
-  O mesmo desejo é dirigido para um alvo irrepreensível e mais elevado (o que se chama "sublimação" do desejo),

- Ou, finalmente, reconhece como justa a repulsa. O mecanismo de recalque e  substituído por um julgamento de condenação com a ajuda das mais altas funções mentais do homem — o controle consciente do desejo é atingido.




Pronunciadas por ocasião das comemorações do vigésimo aniversário da Fundação da Clark University, Worcester, Massachusetts, setembro de 1909
Tradução de Durval Marcondes e J. Barbosa corra, revista e modificada por Jayme Salomão


(Do Livro: Os Pensadores, Abril Cultural, 1974, págs. 11 a 44)