Quarta Lição
Esta lição faz parte do texto: “As cinco lições de psicanálise” palavras pronunciadas
por Freud em ocasião das comemorações do vigésimo aniversário da Fundação da
Clark University, Worcester, Massachusetts, setembro de 1909.
Nesta lição Freud fala sobre sexualidade infantil, e sua relevância na
etiologia da neurose: dos complexos patogênicos e dos desejos recalcados. Os sintomas neuróticos estariam
relacionados às impressões da vida erótica, vividos na primeira infância.
Sobre a etiologia sexual na neurose,
Freud diz: "Quando, em 1895, publiquei com o Dr. J. Breuer os Estudos
sobre a Histeria, ainda não tinha esta opinião; vi-me forçado a adotá-la
quando as minhas experiências se tornaram mais numerosas e penetraram mais
intimamente o problema. Senhores! Acham-se entre os presentes alguns de meus
adeptos e amigos mais chegados, que viajaram comigo até Worcester. Se os
interrogarem, ouvirão que todos eles a princípio recebiam com a maior descrença
a afirmação da importância decisiva da etiologia sexual, até que pelo exercício
analítico pessoal foram obrigados a aceitar como sua própria àquela
afirmação." Freud S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund Freud -
QUARTA LIÇÃO. (1909).
"O trabalho de análise necessário
para o esclarecimento completo e cura definitiva de um caso mórbido não se
detém nos episódios contemporâneos da doença; retrocede sempre, em qualquer
hipótese, até a puberdade e a mais remota infância do doente, para só aí topar
as impressões e acontecimentos determinantes da doença ulterior. Só os fatos da
infância explicam a sensibilidade aos traumatismos futuros e só com o
descobrimento desses restos de lembranças, quase regularmente olvidados, e com
a volta deles à consciência, é que adquirimos o poder de afastar os
sintomas." Freud S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund Freud -
QUARTA LIÇÃO. (1909).
Os desejos recalcados da infância são
indestrutíveis, e estes emprestaram à formação dos sintomas força a sua
sustentação.
Falar sobre sexualidade humana é um
tanto complicado, até mesmo nos dias atuais, imagine falar sobre sexualidade
infantil em 1900? Freud utilizou diversos recursos para explicar a sua
psicanalise, inclusive interagindo com outros autores: "Por um feliz
acaso acho-me em condições de chamar dentre os presentes uma testemunha em
favor de minhas afirmações. Eis aqui o trabalho do Dr. Sanford Bell, impresso
em 1902, em The American Journal of Psychology. O autor é um Fellow da
Clark University, o mesmo instituto em cujo seio nos achamos no atual instante.
Nesse trabalho, intitulado "A Preliminary Study of the Emotion of Love
Between the Sexes", publicado três anos antes dos meus Three
Essays on the Theory of Sexuality [1905 d], (Três
Ensaios Sobre a Teoria da Sexualidade), escreve o autor, tal qual há pouco
lhes dizia: "A emoção do amor sexual… não aparece pela primeira vez no
período da adolescência, como se tem pensado." Procedendo "à
americana", como diríamos na Europa, reuniu durante 15 anos nada menos de
2.500 observações positivas, das quais 800 são próprias. Dos sinais por que se
revelam esses temperamentos namoradiços, diz ele: "O espírito mais
desprevenido, observando estas manifestações em centenas de casais de crianças,
não poderá deixar de atribuir-lhes uma origem sexual." O mais rigoroso
espírito satisfaz-se quando a estas observações se juntam as confissões dos que
em criança sentiram a emoção intensamente e cujas recordações daquela época são
relativamente nítidas". Freud S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund
Freud - QUARTA LIÇÃO. (1909).
"Não me admiraria se estas
observações de seu compatriota lhes merecessem mais crédito que as minhas. A
mim mesmo foi-me dado obter recentemente um quadro mais ou menos completo das
manifestações instintivas somáticas e das produções mentais num período precoce
da vida amorosa infantil, graças à análise empreendida, com todas as regras,
pelo próprio pai de um menino de cinco anos atacado de ansiedade. Devo
lembrar-lhes que meu amigo Dr. C. G. Jung há poucas horas, nesta mesma sala,
lhes expôs a observação de uma menina ainda mais nova, que pelo mesmo motivo do
meu paciente (nascimento de um irmãozinho) evidenciava quase os mesmos impulsos
sensuais e idêntica formação de desejos e complexos. [Cf. Jung, 1910.] Não
duvido, pois, de que os presentes se acabarão familiarizando com a ideia, de início
tão exótico, da sexualidade infantil; memore-se o exemplo notável do psiquiatra
E. Bleuler, de Zurique, que há poucos anos dizia publicamente que não
compreendia minha teoria sexual’ mas que de então para cá, pôde, mediante
observações próprias, confirmar a sexualidade infantil em toda a extensão (Cf.
Bleuler, 1908.)." Freud S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund Freud
- QUARTA LIÇÃO. (1909).
A sexualidade infantil:
A sexualidade não esta relacionada exclusivamente
a reprodução, mas principalmente a obtenção de sensações prazerosas no corpo. A principal fonte de prazer sexual infantil é proveniente do seu próprio corpo, das excitações das zonas
erógenas. Determinadas partes do corpo são particularmente excitáveis, além
dos órgãos genitais: os orifícios da boca, ânus e uretra e também a pele e
outras superfícies sensoriais. Qualquer parte do corpo pode ser excitável e excitante, a medida que é
investida libidinalmente por um cuidador. As zonas erógenas existem porque são investidas no momento da alimentação, no momento do banho, na educação
ao controle esfincteriano. A fase da vida sexual
infantil onde a satisfação é obtida através do próprio corpo é denominada de auto erotismo.
Ao lado das atividades auto eróticas,
revelam-se muito cedo as escolhas objetais. Ou seja, a libido é investida em
objetos externos, com o intuito de se obter prazer.
Há o abandono do
autoerotismo, para só depois investir nos objetos do mundo externo? Como o bebê
elege os objetos a serem investidos? Na realidade não existe um objeto
propriamente dito, existe sim o prazer sentido em alguma parte do corpo e a
ânsia que isso se repita. Como desejo e amor se articulam? Já que o
objeto investido libidinalmente é a princípio o objeto amado. O objeto amado é
desejado também?
As escolhas dos objetos neste momento
estão relacionadas à conservação. Ou seja, os objetos investidos
libidinalmente pelo bebê, são aqueles que satisfazem suas necessidades básicas
(alimentação, frio e fome), mas também de amor. Afinal, nós humanos somos seres
pulsionais, não temos um objeto especifico que nos satisfaça, e nossas
satisfações são sempre parciais. O bebê à medida que é alimentado é investido
libidinalmente, e investe nos objetos. O amor, necessidade e desejo dos pares
se entrelaçam: investimos à medida que somos investidos. É absolutamente normal
e inevitável que a criança faça dos pais o objeto da primeira escolha amorosa.
Porém a libido não permanece fixa neste primeiro objeto: posteriormente o
tomará apenas como modelo, passando dele para pessoas estranhas, na ocasião da
escolha definitiva.
Pulsão e sexualidade:
Pulsão e sexualidade:
A pulsão é um conceito que esta entre o
somático e o psíquico: temos uma base fisiológica do psiquismo que apresenta
muitas peculiaridades que nos torna radicalmente diferentes dos outros animais. Somos pulsionais, falantes, mortais e sexuais.
Nesta parte do
texto Freud aborda os aspectos da oposição nas pulsões: ativo e passivo. Será que
essas posições em relação aos objetos são de oposição definitiva? Ou o sujeito
modifica sua posição a partir do objeto eleito? Ou ainda a escolha do objeto
estaria relacionada à maneira, tal qual o posicionamento do objeto? O sadismo e
o masoquismo são exemplos desta oposição, ou ainda o prazer visual, ativo ou
passivo.
"Do gozo visual ativo
desenvolve-se mais tarde a sede de saber, como do passivo o pendor para as
representações artísticas e teatrais." Freud S. Cinco lições de
Psicanálise Sigmund Freud - QUARTA LIÇÃO. (1909).
Mantem-se zona erógena de satisfação
parcial. (do gozo visual a sede de saber) Posicionamento ativo. Ou a satisfação
passiva de ser vista, ou talvez neste caso a posição reflexiva, como no caso do
ator, ele se põe a ser visto. Enfim, neste paragrafo Freud introduz o olhar
como uma suposta zona erógena, e também introduz a posição reflexiva, apesar de
colocar o ator como passivo.
Sobre a sexualidade infantil Freud diz:
"Esta vida sexual
infantil desordenada, rica, mas dissociada, em que cada impulso isolado se
entrega à conquista do gozo independentemente dos demais, experimenta uma
condensação e organização em duas principais direções, de tal modo que ao fim
da puberdade o caráter sexual definitivo está completamente formado. De um lado
subordinam-se todos os impulsos ao domínio da zona genital, por meio da qual a
vida sexual se coloca em toda a plenitude ao serviço da propagação da espécie,
passando a satisfação daqueles impulsos a só ter importância como preparo e
estímulo do verdadeiro ato sexual.” Freud S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund
Freud - QUARTA LIÇÃO. (1909)
Além da condensação o sujeito psiquicamente
vai “organizando” o caos: de sua pulsão (perversa e polimorfa), de seu desejo e
consequentemente de seus investimentos libidinais. Para isso, impulsos são recalcados e algumas
forças psíquicas surgem como sentinelas: moral, repugnância e a
vergonha/constrangimento. Claro que, essas organizações, parâmetros e limites
são alcançados, mas com perdas. O sujeito se submete a isso por amor. Os
Ideais são construídos para servirem de parâmetros e limites, em contrapartida algo
que exige do sujeito por vezes o inalcançável. Dos primeiros investimentos da criança
surgem os modelos de objeto amoroso, mas também os modelos de identificação: de
ternura e hostilidade.
"Senhores.
Um princípio de patologia geral afirma que todo processo evolutivo traz em si
os germes de uma disposição patológica e pode ser inibido ou retardado ou
desenvolver-se incompletamente. Isto vale para o tão complicado desenvolvimento
da função sexual que nem em todos os indivíduos se desenrola sem incidentes que
deixem após si ou anormalidade ou disposições a doenças futuras por meio de uma
regressão. Pode suceder que nem todos os impulsos parciais se sujeitem à
soberania da zona genital; o que ficou independente estabelece o que
chamamos perversão e pode substituir a finalidade sexual
normal pela sua própria. A propensão à neurose deve provir por
outra maneira de uma perturbação do desenvolvimento sexual. As neuroses são
para as perversões o que o negativo é para o positivo.” Freud S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund Freud - QUARTA
LIÇÃO. (1909)
Enfim, a sexualidade infantil é vivida de
maneira excessivamente intensa e prematura pela criança. Esse contato com o
sexual é traumático e nos conduz a uma espécie de fixação parcial. “O complexo
assim formado é destinado ao recalque, porém continua a agir do inconsciente
com intensidade e persistência. Devemos declarar que suspeitamos represente
ele, com seus derivados, o complexo nuclear de cada neurose, e nos
predispusemos a encontrá-lo não menos ativo em outros campos da vida psíquica.”
Freud S. Cinco lições de Psicanálise Sigmund Freud - QUARTA
LIÇÃO. (1909).
PAULA ADRIANA NEVES COUTO
Psicanalista clínica
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