Os capítulos 6 e 7 do livro: “Além do
princípio do prazer” de S. Freud são riquíssimos.
O autor utiliza-se da
biologia e por vezes a filosofia para teorizar sobre as pulsões de vida e morte
compulsão a repetição e o princípio do prazer.
No texto, Freud aborda a morte sob
diversas perspectivas, sempre em relação
a vida:
A imortalidade - a eternidade - vida sem a morte;
A mortalidade - vida e morte complementares;
A morte e o morrer, sendo a primeira
como algo imediato e o morrer como algo diário e constante e;
Finalmente as pulsoes de vida e morte:
tempo singular das coisas vividas. Temos uma centelha de vida todos os dias e a
constância da morte a cada final de hora.
Por ser um texto trabalhoso que exigiu
enorme atenção, escolhi percorrê-lo quase parágrafo a parágrafo:
"Até
este momento, nossa conclusão é de que uma forte oposição entre as
"pulsões do Eu", que impelem em direção a morte, e as pulsões
sexuais, que impelem para a continuidade da vida: contudo, em diversos
aspectos, esse resultado nos parece pouco satisfatório e a ele se acrescenta
ainda mais uma dificuldade.Se, de acordo com a nossa hipótese, as pulsões do Eu
originam-se de uma vivificação da matéria inanimada e visam restaurar de novo o
estado inanimado, então em rigor, somente a essas pulsões poderíamos atribuir o
caráter conservador - ou melhor, regressivo - que havíamos afirmado derivar de
uma compulsão á repetição inerente a todas as pulsões." S.
Freud. "Além
do Princípio do Prazer." (1920)
Existe dualidade entre as
pulsões sexuais (vida) e as pulsões do Eu (morte) . Será que vida e morte
se opõe? Ou vida e morte se complementam? Parte de nós a partir da pulsões de
vida, investem nos objetos, na reprodução e na união, enquanto outra parte
guiada pela pulsões de morte visam retornar a um estado anterior - ao
nada.(retorno ao inanimado).
A compulsão à repetição é característica da pulsão: como explicá-la nas pulsões de vida, onde a própria ideia da repetição parece contraditória? Contraditória porque a reprodução sexual por si só visa novas sensacoes, um novo ser, e isto parece estar longe da repeticao.
"Entretanto no que tange às pulsões sexuais, observa-se com clareza que
elas reproduzem os estados primitivos dos seres vivos, e a meta que almejam
alcançar por todos os meios é a fusão de duas células germinativas já
diferenciadas entre si em determinados aspectos; porém se essa união não
ocorre, a célula germinativa morre, assim como todos os outros elementos do
organismo multicelular. Portanto, somente sob a condição de que essa
união ocorra é que a função sexual pode prolongar a vida e conferir-lhe a
aparência da imortalidade. Ou seja, no tocante às pulsões sexuais,
a dificuldade adicional reside na pergunta: qual poderia ser o evento
importante, outrora ocorrido no curso do desenvolvimento da substância viva,
que estaria agora sendo repetido por meio da reprodução sexuada ou por meio de
sua fase preliminar, que no caso dos protistas é constituída pela cópula de
dois indivíduos. Na verdade, não sabíamos responder a essa questão, e por isso
seria um grande alívio se toda a nossa construção conceitual se mostrasse por
fim equivocada. Nesse caso, cairia então por terra a oposição entre as pulsões
do Eu (de morte) e pulsões sexuais (vida), e, com isso, também a compulsão à
repetição perderia a importância que lhe havíamos atribuído." S. Freud. "Além do Princípio do Prazer." (1920)
Como até este momento, não há qualquer explicação sobre a compulsão à repetição na pulsão de vida, Freud escolhe um novo caminho a percorrer ao articular: - Pulsões de vida e morte e a mortalidade. Os organismos vivem determinados períodos e morrem naturalmente. Sendo assim vida e morte são inerentes a qualquer organismo.
Será que existem seres eternos que não morrem? A mortalidade é uma certeza?
Weismann
Pesquisador que investigou as questões
sobre a duração da vida e da morte dos organismos. Uma parte da substância viva
está submetida a morte, ao retorno a um estado anterior, enquanto outra parte
está voltada a reprodução, ao novo (transmissão de si a outras gerações). Enfim
existe algo que é mortal (repetição do mesmo) e algo imortal. (reprodução de
algo novo sob à referencia do antigo). Até este ponto é uma concepção
semelhante a de Freud sobre as pulsões.
Para este autor a morte é uma aquisição
tardia aos organismos vivos. A principio éramos imortais. Uma parte de nós é
mortal e outra parte é imortal.
A morte como recurso funcional ao
organismo, surgido só depois, com o advento da reprodução. Por que o advento da
morte a partir da possibilidade da reprodução? A reprodução como algo que
transmite os caracteres hereditários por gerações, possibilitando a
imortalidade parcial de cada ser, mas também é o que trouxe a possibilidade da
morte. Os organismos são imortais a partir dos seus descendentes, uma
imortalidade parcial.
Existem diferenças entre
as concepções da morte e de pulsão de morte:
A morte - algo natural -
degeneração, envelhecimento e falência - imediata. Pulsão de morte - constante
- tentativa do organismo de um retorno ao inanimado --> algo em nós que
pulsa para a morte. É possível pensar na morte sem a vida? ou na vida sem
a possibilidade do morrer?
Alguns autores, e algumas
concepções sobre a morte e o morrer: a vida sem a morte - imortalidade e a
morte sem a vida - inanimado
Goethe(1883): a morte como
consequência direta da reprodução. A reprodução traz a possibilidade de se
obter várias gerações de uma mesma coisa, de contar o tempo. Para Hartmann a morte não necessita de um corpo:
morte como a "conclusão do desenvolvimento individual". No caso dos
protozoários a reprodução coincide com a morte. Woodruff, pesquisador americano, que comprovou a
imortalidade da substância viva nos animais unicelulares. Demonstrando a
imortalidade do ser através das gerações. A imortalidade através dos
descendentes. Do ponto de vista destes autores, até mesmos os seres vivos
mais simples a imortalidade só é possível parcialmente.
" (...) Ou seja,
as forcas pulsionais que conduzem a vida para a morte também poderiam estar
operando nos protozoários desde o inicio e seu efeito poderia estar tão
encoberto pelas forcas conservadoras da vida que seria muito difícil prova-lo diretamente. Além
disso, pelo que sabemos, as observações dos biólogos permitem supor que
mesmo entre os protistas existam processos internos que conduzem a morte.
Mas, ainda que os protistas se provassem imortais no sentido de Weismann, sua
afirmação de que a morte e uma aquisição tardia seria válida apenas no que
tange ao sinais visíveis da morte, e não inviabilizaria nenhuma hipótese sobre
os processos inerentes que pressionam para a morte. Portanto, nossa
expectativa de que a biologia refutasse a existência das pulsões de morte não
se realizou, e podemos continuar nos interrogando sobre a possibilidade da
existência da pulsão de morte." S. Freud. "Além do
Princípio do Prazer." (1920) p. 170
Weismann faz uma divisão entre o soma e as células germinativas,
segundo Freud esta divisão seria análoga as duas concepções de pulsão de morte
e de vida:
Células
somáticas (do grego σωματικός: sōmatikós,
significado: corporal)1 são quaisquer células responsáveis
pela formação de tecidos e órgãos em organismos
multicelulares2 . Esta classificação engloba todas as células diplóides do corpo humano (inclusive aquelas que não formam
tecidos, como as células imunológicas), que
se replicam apenas por processo de mitose e que, portanto, não estão envolvidas
diretamente na reprodução3 (ver células
germinativas).
Nos organismos multicelulares, as células
germinativas são células que
podem dar origem aos gâmetas, no caso dos animais,
o espermatozoide e o óvulo.1
Em
muitos animais, incluindo a Drosophila, as células germinativas
primordiais diferenciam-se nas primeiras fases de
desenvolvimento do embrião,
migram para a região onde se formarão as gónadas e
iniciam o processo da gametogénese.
Nas plantas, elas
só se diferenciam, a partir de células meristemáticas durante
o desenvolvimento dos órgãos sexuais, como a flor, nas angiospérmicas.
E. Hering fala sobre dois
processos opostos em ação constantemente nas substâncias
vivas:
A. Construtivo/
assimilatório
B.
Demolidor/dissimilatório.
Schopenhauer(filósofo): a morte como consequência da vida,
ou seja, vida e morte se complementam. Dois processos podem ao mesmo tempo se opor
e se complementar? Ou seja, a morte como meta final da vida.
"Devemos ousar identificar nessas duas orientações dos processos vitais as nossas duas moções pulsionais, as pulsões de vida e as pulsões de morte? Mas há outra coisa que não podemos ignorar: sem percebermos, aportamos na filosofia de Schopenhauer, para quem a morte seria: "o resultado propriamente dito" da vida e, nesse sentido, sua finalidade, enquanto a pulsão sexual seria a encarnação da vontade de viver. " S. Freud. "Além do Princípio do Prazer." (1920) p. 171
"Nesta acepção, cada célula
ajudaria a preservar a vida das outras, de modo que a comunidade celular
poderia continuar a viver mesmo que algumas células individuais precisassem
morrer. Sabemos também que a cópula, isto é, a fusão temporária de dois
organismos unicelulares, os mantém vivos e os rejuvenesce. Sendo assim, poderíamos tentar transpor a teoria psicanalítica da libido
para a interação entre as células."
S. Freud. "Além do Princípio do Prazer." (1920)
"Imaginemos então que
as pulsões de vida ou pulsões sexuais atuantes em cada célula tomam as outras
células como objeto e, em parte, neutralizam suas pulsões de morte, isto
é, neutralizam os processos que as pulsões de morte desencadeiam nessas
células, logrando assim, mante-las vivas. Enquanto isso, outras células, por
sua vez, fazem o mesmo pelas primeiras. Entretanto, algumas outras células se
sacrificam para exercer essa função libidinosa. Quanto as células
germinativas, estas adotariam uma conduta absolutamente "narcísica",
para utilizar a expressão que empregamos na teoria da neurose ao descrevermos um
indivíduo que retém sua libido no Eu e que não gasta nenhuma porção dela
em investimentos objetais. As células germinativas precisam guardar para
si mesmas uma reserva de sua libido - a atividade de suas pulsões de vida -
para utilizá-la posteriormente em sua grandiosa atividade de
construção. " S. Freud. "Além
do Princípio do Prazer." (1920)
Um grupo de células cuida
da preservação do próprio organismo, enquanto outro grupo é responsável pela
reprodução. As células que trabalham no sentido da preservação: armazenam
libido em si. Freud as chama de narcísicas (analogia com a libido investida no
Eu).
Apesar de Freud tentar fazer
uma analogia entre psiquismo e a biologia, ao que parece, no campo da biologia cada
célula tem função específica. No psiquismo as coisas não acontecem desta
maneira: há oposição e há conflito. Em relação à libido, e as pulsões, parece
que existe um movimento dialético: quanto mais a libido é investida no objeto,
menos se investe no eu e vice e versa.
Segundo Freud os primeiros investimentos de libido seriam
direcionados ao eu, com o intuito da autoconservação e formação do Eu/corpo.
Até porque o corpo do bebê é libidinizado por alguém.
Qual a função da libido
que permanece investida no eu e não nos objetos após a constituição? Em que
momento a libido é voltada aos objetos?
Fome e amor foram os
primeiros elementos utilizados para articular libido e pulsão. Ambos
fundamentais à nossa humanidade. Se não nos alimentarmos morremos, e sem
amor não nos humanizamos.
Amor no sentido mais
radical (se isto existir), das relações
primordiais com o outro, nosso semelhante que nos nutriu com alimento e amor.
Essas relações primordiais deixam rastros, que são demonstrados nas psiconeuroses
A teoria das pulsões
trouxe desde os primórdios a diferença entre: pulsão e instinto. Nós humanos
somos pulsionais, não somos instintuais. E isso faz toda a diferença.
No instinto há um objeto
especifico de satisfação. A reprodução dos animais é calcada numa determinacao
biológica. Os animais geralmente não
escolhem seus parceiros. Nós humanos somos pulsionais. Há um curto
circuito em relação a articulação amor,
necessidade e desejo. Nossa satisfação é sempre parcial, somos seres sexuais,
escolhemos nossos parceiros. Do nosso próprio jeito de dizer: "fazemos
amor", quando fazemos sexo. Sera que fazemos sexo ou amor? Ou as duas
coisas, ou nenhuma das duas opcoes?
Cada qual exercita sua sexualidade ou encontra prazer de uma maneira
singular. É impossível falarmos de sexualidade humana de uma maneira simples e
direta.
Freud após falar da libido
e pulsão, propõe um retorno às formulações do eu. (Neste ponto fico muito
confusa em relação a articulação libido e eu, porque não consigo articular
esses dois elementos.)
O eu nos primórdios da
psicanálise era uma instância protetora do mundo exterior (formações reativas)
e do próprio psiquismo do sujeito (recalque, censura). A
libido em alguns momentos era a energia utilizada nos investimentos objetais,
mas tambem podia ser reinvestida pelo eu, num movimento de introversão. Freud
para resolver a questão da introversão da libido afirma: o Eu é também um
objeto sexual, o mais importante deles.
"Avançando
de modo bem mais lento e ponderado, a investigação psicanalítica pôde constatar
com que frequência e regularidade a libido era retirada do objeto e dirigida ao
Eu (introversão); e estudando as primeiras fases do desenvolvimento da
libido infantil a psicanálise concluiu que o Eu constituía o verdadeiro e
original reservatório da libido. Para chegar até o objeto, teria de partir
desse reservatório.” S. Freud. "Além
do Princípio do Prazer." (1920)
O reservatório da libido é
o Eu? Nota de rodapé: "Esta hipótese é apresentada em pormenor no trabalho
de Freud sobre o narcisismo (1914),, também sua posterior nota de rodapé no
capítulo III de Eu e o Isso 1923b), na qual essa afirmação é corrigida, e
em seu lugar o Isso é descrito como "o grande reservatório da
libido." S. Freud. "Além
do Princípio do Prazer." (1920)
A libido investida no eu
era denominada libido narcísica, apesar de ser a mesma libido investida nos
outros objetos. Se o Eu é também um objeto sexual, como explicar a
diferenciação entre as pulsões do eu e as pulsões sexuais? Como explicar a
oposição nas pulsões? E o que dirá do conflito pulsional na neurose?
Sobre isso Freud diz:
"Com isso a primeira oposição que havíamos suposto existir entre as
pulsões do eu e as pulsões sexuais tornou-se uma hipótese insatisfatória.
Reconheceu-se que uma parte das pulsões do Eu era de natureza libidinal, e
provavelmente haveria também pulsões sexuais, além de outras, agindo no
interior do Eu. Todavia, ainda assim justifica-se que mantenhamos nossa
formulação de que a psiconeurose essencialmente consiste em um conflito entre
as pulsões do Eu e as pulsões sexuais. " S. Freud. "Além do Princípio do
Prazer." (1920)
Freud diante destas
constatações, conclui que a oposição e o conflito existente entre as pulsões
são do ponto de vista tópico. Antes o conflito era do ponto de vista dinâmico
ou econômico? O que significa o conflito existente na neurose de transferência
ser do ponto de vista tópico? O adoecimento do sujeito é resultado do
conflito existente entre as instâncias(pcs/cs e Ics) e nao entre as pulsoes.
"Portanto, agora que ousamos dar esse passo, mas do que nunca se torna necessário
acentuar o caráter libidinal das pulsões de autoconservação. É preciso
identificar a pulsão sexual com Eros - que tudo preserva - e concluir que a
libido narcísica do Eu nasce dos estoques da libido utilizadas pelas células
somáticas para aderirem umas às outras. Mas, por outro lado, se seguirmos esse
caminho, veremos que de imediato se nos colocará a seguinte questão: se as
pulsões de autoconservação também são de natureza libidinal, talvez não exista
nenhuma outra pulsão que não seja libidinal. Ou ao menos não conseguimos
imaginar nenhuma outra. E concluiremos então que temos de dar razão aos
críticos, que desde o início achavam que a psicanálise explicava tudo pela
sexualidade, bem como concordaremos com os inovadores, como Jung, que não
hesitaram em utilizar o termo libido no sentido de "força pulsional"
em geral. Ou não é este o caso? S. Freud. "Além
do Princípio do Prazer." (1920)
p.173
As pulsões são de natureza
libidinal, há uma única libido a serviço das pulsões, inclusive às
pulsões de autoconservação.
As pulsões sexuais são as
pulsões de vida que visam se juntar, que investem nos objetos com o sentido da
vida/viver. Enfim, de modo geral, a libido é a força pulsional. Freud mantém a ideia da dualidade pulsional
entre pulsão de vida e de morte. Se ha uma libido, ou mais ,parece que isso
ficou em aberto neste momento. Talvez isso nao tenha relevancia.
Freud aborda em seguida a
questão do amor e ódio, parece que com o intuito de “juntar” as duas pulsões:
no amor há ódio e na vida há morte. Como ocorre o funcionamento das pulsões de
vida/morte em relação ao amor (ternura)/ódio (agressão)?
O amor deriva do ódio, e o ódio deriva do amor. Existem componentes sádicos na pulsão sexual (Três ensaios sobre a teoria da sexualidade 1905). Nem só agregar cabe a pulsão sexual. Os componentes sádicos trazem um tom de agressividade aos investimentos objetais. E esses componentes de agressividade podem se tornar constantes, num sujeito, na forma do par masoquismo/sadismo. Ou seja, uma pulsão pode ter funções/componentes opostos. Se não há função definida entre as pulsões de vida e morte, o que dá o tom de agressão ou de agregar na pulsão de vida?
"Como podemos derivar de Eros, cuja meta é conservar a vida, uma pulsão sádica que visa a prejudicar o objeto? Não seria sugestiva a ideia de que em verdade esse sadismo seria a pulsão de morte que a libido narcísica logrou afastar do eu de modo que essa pulsão de modo que essa pulsão só consegue manifestar-se no objeto?" S. Freud. "Além do Princípio do Prazer." (1920) p. 174 - 175
Freud diz que a princípio um quantum de agressividade voltado para o EU, é projetado ao objeto, numa medida de proteção. A posteriori com uma função sexual.
"Sabemos que na fase
de organização oral da libido o apoderamento do objeto amoroso e o
aniquilamento do objeto ainda coincidem." Há uma ideia de que o bebê
frente ao seio materno, ama tanto que quer destruí-lo/comê-lo/desintegrá-lo.
(sobre o Narcisismo). "Posteriormente a pulsão sádica se tornaria
então autônoma e, por fim, na fase em que se instala o primado genital com a
finalidade de reprodução, a pulsão sádica assumiria uma função que se faz
necessária para a realização do ato sexual: enfrentar e lidar com o objeto
sexual. De fato, poderíamos dizer que foi o sadismo anteriormente expulso do Eu
que indicou aos componentes libidinais da pulsão sexual o caminho em direção ao
objeto. Só depois disso é que esses componentes poderiam seguir em
direção ao objeto. Nos casos em que o sadismo original não foi mitigado
ou fusionado a outros elementos, veremos instaurar-se na vida amorosa a
conhecida ambivalência amor-ódio."
O ódio advém do amor ou o
amor advém do ódio? Ou são os mesmos elementos? Amor e ódio são nuances de uma
mesma coisa, em relação a determinado objeto?
Sobre o par masoquismo/perversão: "Naquela época, as observações clínicas nos impuseram a conclusão de que o masoquismo, que é uma pulsão parcial complementar do sadismo, devia ser entendida como um redirecionamento do sadismo contra o próprio eu. “(Pulsões e seus destinos. 1915)
Par de
opostos: sadismo e masoquismo e o voyerismo e exibicionismo
O
masoquismo na realidade é o sadismo que retorna em direção ao próprio eu do
indivíduo, O masoquista se posiciona de uma maneira passiva.
1.SÁDICO:
agride, atormenta (ATIVA)
2.O
objeto é abandonado e substituído pelo eu do indivíduo. Com o retorno em
direção ao eu.
3.MASOQUISTA:
(REFLEXIVO) se posiciona de maneira que atraia para si um SÁDICO para
atormenta-lo, agredí-lo (PASSIVA)
Apesar do movimento ser em
relação ao mesmo sujeito, quando o investimento é no EU ou quando o
investimento é no OBJETO, parece que existe algo que se altera quando o
investimento é para um ou pra outro. Essa mudança é em relação a pulsão? Ou em
relação a libido? Ou em relação ao posicionamento ativo/passivo?
"O masoquismo ou o redirecionamento da pulsão contra o próprio eu, seria então, na realidade um retorno a uma fase anterior dessa pulsão, ou seja, uma regressão. Entretanto um ponto a formulação sobre o masoquismo que apresentamos àquela deveria ser corrigido por se mostrar demasiado limitadora, ou seja, além do masoquismo secundário que retorna ao Eu, poderia também existir um masoquismo primário que emana do Eu, embora naquele momento eu tenha contestado essa possibilidade." S. Freud. "Além do Princípio do Prazer." p. 175
O masoquismo primário seria a posição inicial ao invés de sadismo?
1. Masoquismo -
investimento é no eu
2. Sadismo - investimento
é no objeto
3. regressão ao eu (Pulsão
de morte) Masoquismo de novo
O que seria o
masoquismo primário e secundário? É possível pensar num retorno a
um estado anterior...masoquismo como ação da pulsão de morte ? E as
pulsões de vida, neste caso estariam a serviço da pulsão de morte?
Em que condições as
pulsões sexuais conservam a vida, já que a tendência é a morte? A pulsão
de vida não conserva, ela funciona como um start/impulso/centelha à vida.
A pulsão de vida é como uma centelha e a pulsão de morte é uma tendencia á toda substância viva. A fim de comprovar essa afirmativa, Freud novamente se utiliza da biologia: "Mas a questão é como a fusão de duas células apenas levemente diferentes pode produzir essa renovação da vida. Uma resposta mais segura advém do experimento que substituiu a cópula dos protozoários pela ação dos estímulos químicos ou mesmo mecânicos, diremos que esse resultado se produz pelo acréscimo de novas quantidades de estímulos. Isto está em perfeita sintonia com a suposição de que por razões internas o processo vital do indivíduo leva a um nivelamento das tensões químicas, isto é, à morte, ao passo que a união com uma substância viva heterogênea aumenta essas tensões químicas aumenta essas tensões, introduz outras diferenças vitais, que depois precisam ser exauridas através dos processos vitais. Para que essa heterogeneidade seja operante, deve naturalmente haver um ou diversos níveis ótimos. Nesse sentido um dos motivos mais fortes para acreditarmos na existência das pulsões de morte reside em nossa concepção de que a tendência dominante da vida psíquica, ou talvez da vida nervosa em geral, seja, tal como o expressa o princípio de prazer, o anseio por reduzir, manter constante e suspender a tensão interna provocada por estímulos (o princípio de Nirvana). S. Freud. "Além do Princípio do Prazer." p. 176
Não tenho medo da morte
Gilberto
Gil
Não tenho medo da morte
mas sim
medo de morrer
qual
seria a diferença
você há
de perguntar
é que a
morte já é depois
que eu deixar de respirar morrer ainda é aqui
na vida, no sol, no ar
ainda pode haver dor
ou vontade de mijar
na vida, no sol, no ar
ainda pode haver dor
ou vontade de mijar
a morte
já é depois
já não
haverá ninguém
como eu
aqui agora
pensando
sobre o além
já não
haverá o além
o além
já será então
não
terei pé nem cabeça
nem
figado, nem pulmão
como
poderei ter medo
se não
terei coração?
não
tenho medo da morte
mas
medo de morrer, sim
a morte
e depois de mim
mas
quem vai morrer sou eu
o
derradeiro ato meu
e eu
terei de estar presente
assim
como um presidente
dando
posse ao sucessor
terei
que morrer vivendo
sabendo
que já me vou
então
nesse instante sim
sofrerei
quem sabe um choque
um
piripaque, ou um baque
um
calafrio ou um toque
coisas
naturais da vida
como
comer, caminhar
morrer
de morte matada
morrer
de morte morrida
quem
sabe eu sinta saudade
como em
qualquer despedida
É possível pensar o morrer como fazendo parte da vida diária. É possível pensar no humano tentando retornar a um tempo de inércia, numa tentativa de reencontro com algo supostamente pleno ou ainda manter as coisas como estão. Entretanto é inviável pensar que isto que se repete é exatamente o momento de sofrimento, no tempo de dor. Como relacionar a pulsão de morte ao tempo de sofrência?
Freud continua a se questionar: se a repetição é característica geral das pulsões, onde está a repetição na pulsão de vida? O desenvolvimento das substancias vivas pode ser considerado uma repetição da própria origem da vida?
"O sexo então não seria muito antigo, e
as pulsões extraordinariamente intensas que buscam promover a união sexual
estariam apenas repetindo algo que aconteceu uma vez acidentalmente e que se
consolidou desde então por trazer vantagens." S. Freud. "Além do Princípio do
Prazer." p. 177.
Freud recorre a filosofia de Platão para explicar a questão da repetição na pulsão: a necessidade de restabelecer um estado anterior. Mito desenvolvido no Simpósio por intermédio de Aristofanes.
Freud recorre a filosofia de Platão para explicar a questão da repetição na pulsão: a necessidade de restabelecer um estado anterior. Mito desenvolvido no Simpósio por intermédio de Aristofanes.
"No inicio, nosso
corpo não era formado como agora; era totalmente diferente. De inicio havia
três sexos, não como agora, somente masculino e feminino, mas ainda um terceiro
que unia ambos, o sexo masculino-feminino (...) Porém, tudo nesses seres humanos era duplo,
eles tinham, portanto, quatro mãos e quatro pés, dois rostos, dois órgãos
genitais, etc. Então Zeus decidiu dividir cada ser humano em duas partes,
"como se cortam marmelos para fazer confeito (...). Estando agora o ser
inteiro cortado em dois, a saudade impeliu (trieb) as duas metades se juntaram:
elas se abraçaram com as mãos, enlaçaram-se uma à outra no desejo de fundir-se
em um só ser....(...) S. Freud. "Além
do Princípio do Prazer." p177
As substâncias vivas a
princípio rompidas em pequenas partículas anseiam reunir-se novamente através
das pulsões sexuais?
Na realidade a tentativa
de retorno/regressão a um estado anterior, ao inorgânico não é prerrogativa das
pulsões, mas é algo universal.
Cap VII
Ainda falta determinar a relação existente entre os processos pulsionais de repetição e a soberania do principio do prazer. Será que manter a tensão o mais baixo possível (soberania do Princípio do prazer), não se trata de repetição?
Uma das funções do Aparelho
psíquico é capturar e atar (binden) as moções pulsionais que
chegam a ele, com o objetivo de transformar o processo primário em secundário,
que consiste em transformar a carga de investimento livre/móvel em carga de
investimento em repouso/tônica.
Caso houvesse de fato a soberania do princípio do prazer, não haveria desprazer, entretanto não é bem assim que as coisas acontecem.
Caso houvesse de fato a soberania do princípio do prazer, não haveria desprazer, entretanto não é bem assim que as coisas acontecem.
Aparelho psíquico à desprazer à aumento de tensão à Ação Princípio do prazer.
Existem situações que:
Processos primário/secundário
à Aparelho psíquico à desprazer à aumento de tensão à não suspende a ação do
principio do prazeràmanutenção do desprazer.
Esse desprazer não causa aumento
de tensão? Esse desprazer é bem vindo? Ou esse desprazer é sentido como prazer?
Funções do aparelho psíquico:
Manter a tensão o mais
baixo possível - Soberania do princípio do prazer
Capturar/atar cargas de
investimentos livres móveis e transformá-la em cargas de investimento (pulsões)
em repouso. (transformação do processo primário em secundário).
Essas duas funções no
aparelho psíquico são discordantes,pois a transformação das cargas de
investimento causam desprazer e consequentemente aumento de tensão no aparelho
psíquico. Isso não significa que o princípio do prazer é suspenso, essa
transformação assegura a soberania do Princípio do prazer. Sendo assim o
aparelho psíquico suporta o desprazer. Qual a medida do desprazer suportado no
aparelho psíquico?
Partindo desta aparente
discordância no aparelho psíquico entre a produção de desprazer na transformação
entre processos primário e secundário e a manutenção da tensão ao mais
baixo possível, Freud fala da diferença entre função e tendência: "O Princípio do prazer é uma tendência
que está a serviço de uma função" (p.180)
A função do
princípio do prazer é tornar o aparelho psíquico inteiramente livre da
excitação, ou manter a tensão o mais baixo possível ou ainda manter a excitação
constante e a tendência "trabalhando" no sentido desta função. Essa
função vai de encontro àquela dita anteriormente: retorno ao inorgânico,
inércia...Freud diz também de algo que causa uma enorme excitação, para
"só depois" regredir ao nada, a baixa excitação...
"Também sabemos que o
maior prazer que podemos atingir, o do ato sexual, esta ligado a uma extinção
momentânea de uma excitação que havia sido intensificada ao máximo. Igualmente
já afirmamos acima que a captura e enlaçamento da moção pulsional é uma função
preparatória que visa a providenciar a eliminação definitiva da excitação no
fluxo do prazer durante o processo de escoamento(abfuhr) dos estímulos
acumulados. " S. Freud. "Além
do Princípio do Prazer. (1920)"
No próprio aparelho psíquico é "produzido" um aumento de
excitação, para "só depois" diminuir essa tensão ao mais baixo
possível.
As cargas de investimentos
livres/móveis próprias ao processo primário causam no aparelho psíquico maior
carga de excitação do que as cargas de investimentos em repouso/tônicas
(processo secundário). O processo primário produz sensações mais intensas, que
aqueles oriundos do processo secundário.
"Processo primário: modo de funcionamento
caracterizado, no plano econômico, pelo livre escoamento da energia e pelo
livre deslizamento no sentido. O inconsciente é o lugar por excelência, desse
processo, cujos mecanismos específicos são o deslocamento e a condensação, como
os modos de passagem de uma representação a outra. Os processos secundários,
que são o verdadeiro suporte do pensamento lógico e da ação controlada. Os
processos primários, ao contrário, correspondem a um pensamento livre,
imaginativo, no qual o movimento dos significantes não sofre o peso dos
conceitos, como é o caso justamente dos sonhos." (Chemama R. Dicionário de
Psicanálise)
Das afirmações anteriores
sobre o princípio do prazer, da transformação das cargas de investimento
(processo primário e secundário) e aumento e baixa de excitação Freud chega à
algumas conclusões e as denomina como nada simples: "(...)o anseio por
prazer manifesta-se com muito mais intensidade no início da vida psíquica do
que posteriormente, mas por não ter meios para evitar frequentes interrupções,
ele só ocorre de forma limitada. Em uma fase mais madura do desenvolvimento,
quando a soberania do princípio do prazer já estiver muito mais
assegurada, veremos contudo, que o princípio do prazer, tal como as
outras pulsões não terá podido escapar de ser domado* (bandigung).
De qualquer maneira, aquilo que no processo de excitação determina as
sensações de prazer e desprazer deve estar presente no processo
secundário da mesma maneira que no processo primário.
* Algo que pode ser freado, mas nunca
dominado
Outra afirmação importante
de Freud neste final de texto: "O princípio de prazer parece, de fato,
estar a serviço da pulsão de morte. Embora lhe caiba vigiar os estímulos
(Reize) de origem externa - que são tomados como perigos pelos dois tipos de
pulsões -, ele se volta particularmente para o perigo representado pelo aumento
da quantidade de estímulos procedentes de dentro, os quais visam a
dificultar a tarefa da vida. Por sua vez, este tema também se articula com
diversas outras questões às quais no momento não temos como responder. É
preciso, contudo, que sejamos paciente e aguardemos até que tenhamos outros
recursos de investigação e que se abram novas oportunidades para prosseguirmos
com outros estudos." S. Freud. "Além
do Princípio do Prazer." (1920) p.182
O que Freud quer dizer
quando diz que o princípio do prazer parece estar a serviço da pulsão de
morte? O Além do princípio do prazer se situa onde? O princípio do
prazer e o mais além do princípio do prazer se misturam de tal forma que
parecem ser da mesma ordem, buscando o mesmo fim - remover a tensão.
Em uma entrevista ao jornalista americano George Sylvester
Viereck, em 1926 e publicada na íntegra no volume “Psychoanalysis and the Future”, número especial do “Journal of Psychology”, Nova Iorque, em
1957, Freud tece algumas considerações ao que ele discute no seu livro “Além do
Princípio do Prazer”. A entrevista foi publicada em português, pela primeira
vez, no volume 15 da Revista Ide, em 1998, e reimpressa recentemente no Jornal
da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre. É nessa entrevista que
Freud afirma: “Ainda prefiro a
existência à extinção. Talvez os deuses sejam gentis conosco, tornando a vida
mais desagradável à medida que envelhecemos. Por fim, a morte nos parece menos
intolerável do que os fardos que carregamos. (...) A velhice, com suas agruras,
chega para todos. Eu não me rebelo contra a ordem universal”.
Em um trecho adiante, quando perguntado sobre a persistência da sua personalidade após a morte, Freud responde: “Não penso nisso. Tudo o que vive perece. Por que deveria o homem constituir uma exceção? (...) No que me toca, estou perfeitamente satisfeito em saber que o eterno aborrecimento de viver finalmente passará. Nossa vida é necessariamente uma série de compromissos, uma luta interminável entre o Eu e seu ambiente. O desejo de prolongar a vida excessivamente me parece absurdo. (...) É possível que a morte em si não seja uma necessidade biológica. Talvez morramos porque desejamos morrer. Assim como amor e ódio por uma pessoa habitam em nosso peito, ao mesmo tempo, assim também toda a vida conjuga o desejo de manter-se e o desejo da própria destruição”.