terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Enigma - A constituição do sujeito feminino em Freud.

Quando lemos os textos de Freud sobre a constituição do sujeito feminino percebemos um  árduo trabalho para menina: repleta de recortes, idas e vindas.

O primado fálico, a convicção presente nas crianças de que todos os seres tem pênis, coloca o feminino num mal estar estrutural quando ela descobre que não tem o pênis. Essa diferença é vista pela menina como déficit. Algo sai da ordem e como o sujeito feminino responde a esse mal estar, é uma questão.

O Complexo de Édipo no menino surge como uma evolução na fase fálica e sua dissolução advém de sucessivas ameaças da castração e a visão do corpo feminino sem o pênis (falo). Do Complexo de Édipo herda-se o supereu. 

Na menina: " O Complexo de castração prepara para o Complexo de Édipo, em vez de destruí-lo, a menina é forçada a abandonar a ligação com a mãe através de sua inveja do pênis e entra no Édipo como refúgio."

Na menina durante o Complexo de Édipo se operará duas mudanças na sua constituição sexual:
de Zona erógena: do clitóris à vagina; 
e de Objeto amoroso: da mãe ao pai. 

A figura materna terá uma grande importância nesta estruturação, pois para a menina a mãe é a última a ser percebida como destituída de pênis. E essa constatação faz a menina perceber, além da falta de pênis na mãe, sua própria falta. Constatando a castração entrando assim no Complexo de Édipo.

Essa constatação não se dá de maneira imediata, a menina ao perceber a mãe sem pênis, acredita que isso foi um castigo porque a mãe deve ter feito algo muito grave para ter recebido tal castigo. E dessas formulações a menina constata que há seres que tem pênis e há seres que não tem pênis. Entrando na dialética do Ter ou Não ter.

Na menina a castração é percebida como consumada - ela não tem. E essa constatação não é tolerada sem alguma tentativa de compensação.

"Seu Complexo de Édipo em um desejo, mantido por muito tempo, de receber do pai um bebê como presente - de dar-lhe um filho."

Para a menina, a mãe é o primeiro objeto de amor, neste primeiro momento o pai é um rival. 
Desta primeira relação há um deslocamento da mãe ao pai. Entretanto a instancia paterna não faz desaparecer o primeiro Outro(materno). Essa relação mãe/menina é conflitante e ambígua permeada pelo amor e ódio

"Uma poderosa tendência à agressividade está sempre presente ao lado de um amor intenso e, quanto mais profundamente uma criança ama seu objeto, mais sensível se torna aos desapontamentos e as frustrações provenientes desse objeto e no final, o amor deve sucumbir a hostilidade acumulada." 

Para que a menina possa se endereçar a um homem ela precisará fazer uma ruptura em relação a figura materna, por outro lado ela deverá se identificar  com essa figura "odiosa" a fim de construir sua feminilidade.

O processo identificatório ocorre em duas vertentes: 

No período pré edipiano: a mãe como primeiro objeto de amor
Complexo de Édipo: A mãe como rival a ser eliminada, para que a menina possa ocupar-lhe o lugar junto ao pai. 

O complexo de Édipo na menina é conflitante. Freud propõe três saídas possíveis do Complexo de Édipo:

A inibição sexual e/ou neurose: Atitude de desvalorização da menina em relação a mãe, a medida que constata sua falta de pênis - seu clitóris perde o valor diante da impossibilidade de ostenta-lo como objeto fálico, na mesma proporção que o pênis ocupa para o menino. levando a menina a uma inibição da atividade sexual.

Complexo de masculinidade: A menina recusa-se a reconhecer a falta de pênis materno e consequentemente sua própria falta de pênis, obrigando-se a se comportar como se fosse um homem. Guarda consigo a expectativa de um dia vir a ter um pênis, as consequências disso: Sentimento de inferioridade, ciúme feminino e um afrouxamento da ligação da mãe enquanto objeto.

Feminilidade: A mulher procede a um deslizamento simbólico: abre mãe e se dirige ao pai, figura a qual endereçará seu desejo por um filho, como representante de estabelecimento de um desejo feminino por excelência. 

Essa saída abordada por Freud como sendo das três a mais interessante, é uma saída que tem também o falo como referência, consequentemente uma tentativa de se colocar sob a inscrição masculina. 


Será que é possível pensar outra saída para a menina, além do falo?

Esse mal estar estrutural traz consequências ao feminino?

Quando pensamos as estruturas psíquicas: neurose-psicose-perversão, como cada uma lida com essa falta?

No caso da menina há uma dissolução parcial do complexo edípico, sendo assim quais as consequências na formação do Supereu, já que este é herdeiro do Complexo de Édipo?